terça-feira, 27 de outubro de 2009

Kanitz e o legado de Lula: Lula estimulou a criação de empresas brasileiras de classe mundial.

Segue o artigo do Kanitz para seu blog. Trata-se do segundo de uma série de oito prometida acerca do que ele chama de o "legado de Lula".

O primeiro, eu transcrevi aqui.


A idéia de que nações deveriam ser tão eficientes como empresas, que deveríamos criar governos bem administrados e empresas de classe mundial não era bem aceita no passado no Brasil, e nem é até hoje entre alguns partidos políticos deste país, que são contra grandes empresas em geral. Mas é uma antiga bandeira de administradores, e nestes últimos 30 anos há milhares de livros publicados sobre empresas de classe mundial, nunca lidos por membros do governo.

Michael Porter, que foi meu colega em Harvard em 1972, escreveu um influente livro “A Vantagem Competitiva das Nações”. Criou a disciplina de Administração Econômica, o uso de técnicas administrativas para fomentar a Riqueza das Nações.

O mundo, para quem não leu esta linha de pesquisa, será eventualmente dominado por 3000 empresas, 10 empresas distribuídas entre 300 setores importantes da economia, a grosso modo obviamente.

Isto pode assustar muita gente, mas assusta ainda mais se pensarmos que o Brasil nunca se interessou em criar as suas próprias empresas globais para poder melhor competir.

Em 1987, apresentamos Michael Porter ao então Ministro da Fazenda, Bresser Pereira, mas o interesse foi pequeno. Infelizmente, porque na época o Brasil não tinha mais do que duas empresas deste porte, a Vale e a Petrobras. Quando deveria no mínimo ter uns 5% das empresas de Classe Mundial do mundo, ou seja 150 empresas e não duas.

Ao contrario do que muitos imaginam, Lula leu este livro, tanto é que se confunde as vezes citando a “vantagem comparativa das nações”, e não a "vantagem competitiva das nações".

Como a tentativa de aproximar Michael Porter com o governo não ocorreu, por 25 anos mostrei nas Edições de Melhores e Maiores a necessidade de termos empresas de classe mundial. Por isto só posso elogiar um governo que adota teses caras aos administradores há longa data.

Fiz uma palestra na FIESP em 1991, no início do movimento da globalização, onde mostrei ao Conselho da Fiesp, presidido por Mario Amato, que a 500a. maior empresa nacional, num ranking global, caía para a 20.000a. posição. Ou seja seria uma empresa insignificante.

De importante no Brasil, a 500 ésima viraria uma mosca no contexto da globalização.

A maioria dos presentes, da Cofap, da Metal Leve, da Prosdócimo, não se tornaram empresas de classe mundial apesar do alerta. Pior, viraram subsidiárias de empresas estrangeiras em vez de empresas de classe internacional.

Perdemos assim toda a nossa indústria de autopeças e eletroeletrônica, por falta de visão governamental de que empresas brasileiras precisavam ser competitivas a nível mundial.

A tônica de 30 anos de política econômica era impedir inclusive que estas empresas virassem oligopolistas, havia um forte sentimento anti-grande empresa, que perdura até hoje,

A Telebrás, por exemplo, foi pulverizada em nada menos que dezesseis empresas, justamente para impedir o surgimento do “Big Business”. Telefônicas estatais estrangeiras puderam comprar empresas de telefonia brasileiras, o que mostra que o intuito não era privatizar e sim pulverizar o capital.

Nós administradores, também acreditamos em pulverizar e enfraquecer o “capital”, mas não criando empresas fracas, e sim criando capitalistas fracos, onde nenhum é majoritário, via empresas de capital aberto e pulverizado. Enfraquecendo sempre o capitalista, não a empresa.

Assim em vez de consolidar os setores de autopeças, eletroeletrônico, mecânica, etc..., acabamos entregando estes setores a empresas de classe mundial estrangeiras.

Lula numa reunião do Conselho de Economia, se não me engano em 2004, anunciou sua política de empresas de classe mundial, desta forma:

“Precisamos ter empresas líderes mundialmente, empresas capazes de impor seus preços em escala mundial.”

“Precisamos ter empresas líderes nos setores de Mineração, Frango, Papel e Celulose, Agropecuária, Bancos, Telecomunicações”, disse Lula
.

A frase “empresas capazes de impor seus preços”, é inusitada no meio intelectual. Parece ser de um ultra-direitista falando, mas na realidade é simplesmente bom senso.

Trabalhadores sabem que empresas fracas sem “vantagens competitivas” significam sindicatos fracos.

Os economistas da CEPAL são conhecidos pela tese de que agricultura, pecuária e mineração eram péssimos setores e precisavam ser abandonados, porque “os termos de troca” sempre seriam desfavoráveis. Isto significava que trocaríamos cada vez mais minérios e produtos agrícolas por menos produtos industrializados.

Daí a tese da CEPAL de que deveríamos privilegiar a produção de produtos com "alto valor adicionado", como informática, bio-tecnologia etc ; e abandonar as commodities, minério, agricultura, café e frango. Imaginem se tivéssemos seguindo este caminho, como seria nossa situação hoje.

Para termos produtos com "elevado valor adicionado", é necessário enormes programas de ciência e tecnologia, com universidades com elevado alento inovador, pesquisa e inovação, escolas de administração independentes e cursos de empreendedorismo. E quem compra produtos com "elevado valor adicionado" são os ricos, exigindo assim uma industria exportadora ou uma sociedade com péssimos índices de distribuição da renda.

Acontece que temos um setor agrícola e de mineração e não temos universidades voltadas a criar produtos de consumo para as empresas, nem uma classe de ricos grande suficiente, como nos Estados Unidos.

A saída do impasse Cepalino é criar empresas fortes nos setores de agricultura, mineração e frango com capacidade de impor seus preços.

E é neste governo que vemos esta consolidação há tanto tempo defendida pela ciência da administração.

A Brasil Foods foi imposição de Lula, contra seu ex-ministro Luiz Furlan que tentava manter a Sadia como empresa familiar. Foi Lula quem defendeu a fusão com a empresa profissional Perdigão, administrada por administradores e não por membros de uma família.

É no governo Lula que vemos a fusão de Itaú-Unibanco, Marfrig, JBS, Duratex-Satipel, Dasa, VCP-Aracruz, criando empresas de classe internacional.

Decisão bastante criticada, em editoriais e artigos, com o temor que estas empresas usariam sua capacidade de determinar preço para abusar do consumidor nacional, ou que seria uma estatização indireta da economia. Ou que estaríamos criando empresas capitalistas fortes, em detrimento do consumidor.

Refutar estes temores requer um país onde o administrador tem colunas em revistas e jornais, onde professores de administração são sistematicamente ouvidos pela imprensa e pelo governo, o que ocorre em outros países mas não no Brasil

Rapidamente, lembre-se somente que a tendência das megas empresas é reduzir preços e não aumentá-los, vide Wall Mart.

Lula sem dúvida criou o inicio de um movimento, que poderá ser mudado em próximos governos, o que seria um erro, porque ainda falta mais 140 empresas brasileiras de classe mundial para chegarmos às 150 que Michael Porter defendia há vinte anos.

Só que estas empresas recém criadas estão agora aí para sempre. Nenhum governo futuro atreverá cindi-las ao meio novamente, e o sucesso delas certamente será um forte estímulo para provar que a tese original da Cepal estava certa mais com sugestões erradas e que Michael Porter e os milhares de professores e defensores de Empresas de Classe Mundial, de empresas Maiores e Melhores, estavam corretos.

Nenhum comentário: