segunda-feira, 31 de outubro de 2011

OCDE: o Gov. Federal do Brasil obteve enorme progresso no combate a corrupção, que não deve ser ofuscado pelo há por fazer.

Notícia publicada no site da OCDE.


27/10/2011 - Na última década, o Brasil progrediu imensamente no que diz respeito à luta contra a má conduta no setor público. Porém, de acordo com o recente relatório publicado pela OCDE, ainda há espaço para melhoria nos procedimentos de detecção e prevenção de atos indevidos praticados por funcionários públicos.

Dos arquivos do blog:
Pesquisa americana revela: no Brasil pedido de propina é menos comum que nos EUA.
Governo Federal (via CGU) e MPF aprofundam cooperação no combate à corrupção iniciada em 2004.
Carta Capital: especialista da ONU garante: o Brasil tem feito um grande trabalho no combate à corrupção.

A Avaliação de Integridade da Administração Pública federal brasileira, realizada pela OCDE, elogia os esforços do governo federal no desenvolvimento de instituições e práticas que melhoram o nível de integridade de toda a administração pública.

O relatório - apresentado em Brasília por Angel Gurria, secretário-geral da OCDE, e Jorge Hage, Ministro-Chefe da Controladoria-Geral da União, - marca a primeira vez em que o sistema de integridade de um país membro do G20 é submetido a processo de revisão por pares, pela OCDE.

"Integridade não pode depender apenas do comprometimento dos líderes. Este conceito deve contar com sistemas, processos e a organização da administração pública em todos os níveis", de acordo com o Sr. Gurria. “O Brasil tem demonstrado comprometimento com a reforma do setor público para prevenir a corrupção. Há muito ainda a ser feito, mas isso não deve ofuscar o enorme progresso já alcançado. A disposição do Brasil de ser analisado por seus pares em uma questão sistêmica tão importante quanto a da integridade pública destaca seu crescente papel nos debates e processos decisórios internacionais”, acrescentou Sr. Gurria.

A avaliação da OCDE concentra-se em quatro áreas principais: a promoção da transparência e o envolvimento dos cidadãos, a implementação de sistemas de controle interno baseados em risco, a incorporação de elevados padrões de conduta entre os funcionários públicos e a melhoria da promoção de integridade nas contratações públicas.

Os três estudos de caso conduzidos pela OCDE - na administração tributária (Receita Federal do Brasil), no programa de transferência de renda Bolsa Família e no Programa Nacional de DST / AIDS - destacaram diferenças significativas na implementação de medidas de integridade nas organizações públicas. Os estudos de caso demonstram que as autoridades responsáveis pelas medidas de integridade pública devem fornecer orientações práticas de “como fazer” e ferramentas para melhorar o desempenho de organizações públicas, isto paralelamente a iniciativas de âmbito geral no governo. 

Em relação a ações futuras, a OCDE orienta o Brasil a:

* Fazer da gestão de risco uma responsabilidade central de todos os gestores públicos, ao invés de apenas uma tarefa dos auditores internos. Gestores públicos devem ter condições de identificar e gerenciar o risco de fraude, desperdício e corrupção em suas respectivas atividades.
* Assegurar que instituições e servidores públicos sejam capazes de atingir seus respectivos objetivos por meio do acesso a recursos necessários, tais como treinamento, avaliação contínua e compartilhamento de lições aprendidas.
*Integrar as atividades de avaliação atualmente fragmentadas - hoje administradas por diretores, inspetores, auditores internos, ouvidores, comitês de ética e outros – a quadros de gestão mais amplos para apoiar o desempenho e promover a accountability.
* Aumentar a coordenação de órgãos/entidades para o desenvolvimento  de um compromisso coletivo direcionado a  reformas de integridade. Autoridades responsáveis por promover a  integridade poderiam trabalhar em conjunto na avaliação e no planejamento de novas iniciativas de prevenção ao desperdício, fraude e corrupção ou modernização da administração pública.

A avaliação da OCDE sobre a Integridade da Administração Pública federal no Brasil é o quarto trabalho de uma série de estudos sobre Governança Pública no Brasil. Este trabalho dá seguimento a avaliações anteriores realizadas pela OCDE: sobre Orçamento Público, em 2003; Reformas em Regulação, em 2008; e, Gestão de Recursos Humanos no Governo, em 2010. A OCDE está atualmente conduzindo uma avaliação de pares do Tribunal de Contas da União, cuja publicação está prevista para ocorrer em 2012.
Este novo trabalho de avaliação apoia o amplo comprometimento internacional do Brasil em relação aos esforços internacionais de combate à corrupção. O Brasil é signatário da Convenção da OCDE sobre o Combate da Corrupção de Funcionários Públicos Estrangeiros em Transações Comerciais Internacionaisdesde 2000. É também um dos oito países fundadores da Parceria para Governo Aberto (Open Government Partnership) lançada em Nova York no mês de setembro de 2011 - iniciativa multilateral para promover a transparência, combater a corrupção e fortalecer a governança.
Para mais informações, entre em contato com Janos Bertok, Chefe Interino da Divisão de Reformas do Setor Público da OCDE (Janos.Bertok@oecd.org), ou James Sheppard, coordenador da Avaliação de Integridade da Administração Pública Federalbrasileira, na OCDE (James.Sheppard@oecd.org).
Mais informações sobre a Avaliação de Integridade da Administração Pública Federal brasileira, pela OCDE: A Gestão de Riscos Para Uma Administração Pública Mais Transparente e Ética está disponível na página:www.oecd.org/gov/ethics/integrityframework.

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quarta-feira, 26 de outubro de 2011

PIB per capita cresceu 7 vezes mais no Governo Lula do que sob FHC.








Em setembro de 2010, reproduzi aqui no blog um gráfico publicado pelo IBGE com os dados referentes à variação do PIB per capita entre 1995 e 2009. Naquela época, ressaltei que, nos 7 primeiros anos do Governo Lula, o índice subira 5 vezes mais que nos 8 anos do governo FHC.

Passado um ano, fiquei curioso sobre o que revelaria uma comparação parecida, mas que contemplasse novas informações, referentes à riqueza produzida em 2010. Não achei material equivalente ao publicado ano passado, porém, com base nos dados das Contas Nacionais Trimestrais, divulgados pelo IBGE, foi possível elaborar o gráfico e a planilha acima.

Eles revelam que, no Governo Lula, o Produto Interno Bruto cresceu 35,08% – mais do que o dobro dos 14,89% de crescimento observado no Governo FHC. No que diz respeito ao PIB per capita, a diferença é ainda maior: o índice subiu 24,94% no Governo Lula – isto é, 7 vezes mais que a variação no Governo FHC, de módicos 3,54%

Os dados referentes ao ano de 2010 foram colhidos no Caderno das Contas Nacionais Trimestrais do 1º trimestre de 2011; os demais foram retirados do IDIS 2010.

Presidente da AJURIS: A democratização dos meios de comunicação é extremamente importante para que a sociedade tenha autonomia de decisão.

Entrevista publicada pelo Carta Maior.

Distorcion 65, de Andre Kertész


O presidente da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul (Ajuris), João Ricardo dos Santos Costa, criticou a cobertura que o jornal Zero Hora fez de um seminário sobre liberdade de imprensa e Poder Judiciário, em Porto Alegre. A matéria sobre o evento omitiu a parte do debate relacionada aos monopólios de comunicação. “Esse é um caso paradigmático: em um evento promovido para discutir a liberdade de imprensa, a própria imprensa comete um atentado à liberdade de imprensa ao omitir um dos principais temas do evento", diz o juiz em entrevista à Carta Maior.


No dia 21 outubro, a Associação Nacional dos Jornais (ANJ) e a Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul (Ajuris) promoveram, em Porto Alegre, um seminário para discutir liberdade de imprensa e Poder Judiciário. O convite para o encontro partiu da ANJ que já promoveu um debate similar junto ao Supremo Tribunal Federal (Ver artigo de Venício Lima, Direito à comunicação: o “Fórum” e a “Ciranda”). Os interesses temáticos envolvidos no debate não eram exatamente os mesmos. Enquanto que a ANJ e as suas empresas afiliadas estavam mais interessadas em debater a liberdade de imprensa contra ideias de regulação e limite, a Ajuris queria debater também outros temas, como a ameaça que os monopólios de comunicação representam para a liberdade de imprensa e de expressão. 
 
O jornal Zero Hora, do Grupo RBS (e filiado a ANJ) publicou no sábado (24/10/2011) uma matéria de uma página sobre o encontro. Intitulada “A defesa do direito de informar”, a matéria destacou as falas favoráveis à agenda da ANJ – como as da presidente da associação, Judith Brito, e do vice-presidente Institucional e Jurídico da RBS, Paulo Tonet – e omitiu a parte do debate que tratou do tema dos monopólios de comunicação. Na mesma edição, o jornal publicou um editorial furioso contra o governador do Rio Grande do Sul, Tarso Genro, acusando-o de querer censurar o jornalismo investigativo (Ver matéria: Tarso rechaça editorial da RBS e diz que empresa manipulou conteúdo de conferência). No mesmo editorial, o jornal Zero Hora apresentou-se como porta-voz da “imprensa livre e independente” e afirmou que “a credibilidade é a sua principal credencial”.

Agora, dois dias depois de o governador gaúcho acusar a RBS de ter manipulado o conteúdo de uma conferência que proferiu no Ministério Público do RS, omitindo uma parte que não interessava à construção da tese sobre a “censura ao jornalismo investigativo”, mais uma autoridade, desta vez o presidente da Ajuris, João Ricardo dos Santos Costa, vem a público criticar uma cobertura da RBS, neste caso, sobre o evento promovido em conjunto com a ANJ. A omissão da parte do debate relacionada ao tema do monopólio incomodou o presidente da Associação de Juízes.
 
“Esse é um caso paradigmático: em um evento promovido para discutir a liberdade de imprensa, a própria imprensa comete um atentado à liberdade de imprensa ao omitir um dos principais temas do evento, que era a discussão sobre os monopólios de comunicação”, disse João Ricardo dos Santos Costa em entrevista à Carta Maior. 
 
Na entrevista, o presidente da Ajuris defende, citando Chomsky, que “o maior obstáculo à liberdade de imprensa e de expressão são os monopólios das empresas de comunicação”. A “credibilidade” reivindicada pela RBS no editorial citado não suporta, aparentemente, apresentar a voz de quem pensa diferente dela. “O comportamento do jornal em questão ao veicular a notícia suprimindo um dos temas mais importantes do debate, que é a questão dos monopólios, mostra justamente a necessidade daquilo que estamos defendendo”, destaca o magistrado.
 
Carta Maior: Qual foi o objetivo do seminário sobre Liberdade de Imprensa e Poder Judiciário e quais foram os principais temas debatidos no encontro realizado dia 21 de outubro em Porto Alegre?
João Ricardo dos Santos Costa: A Ajuris foi procurada pela Associação Nacional de Jornais (ANJ) para promover um evento com o objetivo de debater liberdade de imprensa e o Poder Judiciário. A relação se justifica pelo grande número de questões que chegam ao Judiciário envolvendo a atividade jornalística. Essas questões envolvem, muitas vezes, decisões que limitam a divulgação de certas matérias. Pois bem, fomos procurados para fazer esse debate que gira em torno de dois valores constitucionais: a liberdade de expressão e a independência do Judiciário. Para alguns haveria um aparente conflito entre esses dois princípios. Nós nos dispomos, então, a construir por meio do debate o que significa a convivência desses dois valores em sociedade democrática. Esse foi o grande desafio que esse evento pretendia enfrentar.

Há duas posições veementes neste debate. De um lado há aqueles que não admitem nenhum tipo de cerceamento à informação; de outro, há aqueles que não admitem qualquer tipo de restrição ao trabalho do Judiciário. Do ponto de vista constitucional, cabe ao Judiciário solucionar todos os conflitos, inclusive os que envolvem a imprensa. A imprensa não está fora das regulações judiciais. Há um embate muito forte entre essas duas posições. Se, de um lado, a ANJ buscou explorar o tema da liberdade de imprensa sob a ótica da atividade judicial, nós buscamos fazer um debate sobre a questão constitucional da liberdade de imprensa, no que diz respeito à distribuição de concessões aos veículos de comunicação.

Carta Maior: Por que a Ajuris decidiu abordar o tema da liberdade de imprensa sob essa ótica?
João Ricardo dos Santos Costa: Chomsky tem dito que o maior obstáculo à liberdade de imprensa e de expressão são os monopólios das empresas de comunicação. Não só ele, aliás. Vários pensadores contemporâneos dizem a mesma coisa. Para nós, esse é o cerne da questão. Hoje não há pluralidade, não há apropriação social da informação. O que existe é o interesse econômico que prepondera. Os editoriais são muito mais voltados aos negócios. Hoje mesmo, o editorial de um jornal local [Zero Hora/RBS] expressa preocupação com a vitória de Cristina Kirchner na Argentina dizendo que seria um governo populista que teria explorado o luto [pela morte de Néstor Kirchner] para se reeleger.

Há toda uma preocupação sobre o que representa esse governo para os negócios das empresas de comunicação, em especial no que diz respeito ao conflito entre o governo argentino e o grupo Clarín. A sociedade brasileira só tem conhecimento do lado da empresa de comunicação. A visão do governo argentino sobre esse tema nunca foi exposta aqui no Brasil.

E aí vem uma questão fundamental relacionada à liberdade de imprensa. O problema não é o que os meios de comunicação veiculam, mas sim o que omitem. Esse é o grande problema a ser superado.

Carta Maior: E esse tema foi debatido no seminário?
João Ricardo dos Santos Costa: No nosso evento, eu lembro de uma fala do deputado Miro Teixeira. Ele disse que a história da censura envolve o cerceamento de grandes pensadores da humanidade, como Descartes, Locke, Maquiavel, Montesquieu, entre outros. Citou isso para exemplificar os danos sociais dessa censura. Mas hoje o que nós observamos é que os grandes pensadores contemporâneos são cerceados não pelos censores que existiam antigamente, mas pelos próprios detentores dos meios de comunicação. Os grandes meios de comunicação não veiculam, não debatem hoje os grandes pensadores da humanidade. Nomes como Amartya Sen, Noam Chomsky, Hobsbwan, entre outros, não têm suas ideias discutidas na mídia, não são procurados para se manifestar sobre as grandes questões sociais. Não são chamados pela grande mídia para dar sua opinião e o que acaba prevalecendo é o interesse do capital financeiro, que é aquele que não vai pagar a conta da crise.

Eu dou esse exemplo para demonstrar a gravidade do problema representado por esse monopólio, esse interesse econômico preponderante sobre o direito à informação. Esse interesse diz incessantemente para a sociedade que a única saída para superar a crise atual é por meio do sacrifício dos mais pobres e dos setores médios da população. Não se toca na questão do sacrifício do setor financeiro. Este setor não pode ter prejuízo. Quem vai ter prejuízo é a sociedade como um todo, mesmo que isso atinja direitos fundamentais das pessoas.

Então, esse debate sobre a democratização dos meios de comunicação é extremamente importante e deve começar a ser feito de forma transparente para que a sociedade se aproprie do que realmente está acontecendo e que possa ter autonomia em suas decisões e mesmo influenciar a classe política que hoje está entregue aos grandes financiadores de campanha que são os mesmos que fornecem a informação enlatada que estamos recebendo. Nós, da Associação dos Juízes do Rio Grande do Sul, estamos propondo esse debate para a sociedade.

Carta Maior: Esse debate que o senhor relatou não apareceu na cobertura midiática do encontro pelo grupo RBS, que participou do mesmo. O jornal Zero Hora dedicou uma página ao encontro, com uma matéria intitulada “A defesa do direito de informar”, sem fazer nenhuma menção a essa parte do debate envolvendo os temas do monopólio e da democratização dos meios de comunicação. Como é que a Ajuris, que propôs esse debate, recebe esse tipo de cobertura?
João Ricardo dos Santos Costa: O comportamento do jornal em questão ao veicular a notícia suprimindo um dos temas mais importantes do debate, que é a questão dos monopólios, mostra justamente a necessidade daquilo que estamos defendendo. É como eu disse antes: o problema maior é aquilo que é omitido, aquilo que não é revelado. Esse é um caso paradigmático: em um evento promovido para discutir a liberdade de imprensa, a própria imprensa comete um atentado à liberdade de imprensa ao omitir um dos principais temas do evento que era a discussão sobre os monopólios de comunicação. Nós não vamos nos omitir em tratar desse assunto por mais dolorido que ele possa ser. É evidente que não é um assunto que deva ser banalizado. Ele é o mais importante de todos. Estamos tratando de pluralidade de pensamento.


Carta Maior: No debate, o deputado federal Miro Teixeira defendeu que a liberdade de imprensa é um direito absoluto. Qual sua opinião sobre isso?
João Ricardo dos Santos Costa: Eu compartilho a ideia de que não há nenhum direito absoluto, não pode haver. Neste contexto de monopólio, menos ainda. Liberdade absoluta de imprensa em um contexto onde sequer a Constituição Federal é cumprida. no sentido de proibir a existência de monopólios. É algo completamente daninho à democracia. Outra coisa com a qual eu também não concordo , envolvendo esse debate, é a afirmação do ministro Marco Aurélio Buzzi (do Superior Tribunal de Justiça) de que nós temos liberdade até para matar. Nós não temos liberdade para matar. Não vejo, dentro da nossa organização jurídica e de sociedade, que tenhamos liberdade para matar. Do fato de, no Código Penal brasileiro, “matar alguém...pena de tanto a tanto” aparecer como uma expressão afirmativa, não se segue o direito de matar. Nós não podemos matar e não podemos violar o Direito. Não temos essa liberdade. Não temos a liberdade de tirar a liberdade das outras pessoas. O direito individual não chega a esse radicalismo que se pretende com essa afirmação de que a liberdade de imprensa é um direito absoluto.


Carta Maior: A ANJ realizou recentemente, no Supremo Tribunal Federal (STF), um seminário semelhante a este realizado no Rio Grande do Sul. Há, portanto, uma óbvia preocupação com a posição do Poder Judiciário neste debate. Qual é, na sua avaliação, o papel do Judiciário neste contexto?
João Ricardo dos Santos Costa: O fato de se debater, em primeiro lugar, é um grande caminho para amadurecer esses institutos que, aparentemente, estão colidindo, na sociedade. É lógico que o Judiciário, nesta e em outras grandes questões da sociedade brasileira, tem sido provocado a se pronunciar. Muito pela ineficiência do Poder Legislativo. O STF tem decidido sobre questões que o Legislativo se mostra incapaz de resolver: união homoafetiva, aborto, demarcação de terras indígenas, células-tronco, entre outros. A pressão envolvendo esses temas está vindo para cima do Judiciário. E o Judiciário, por sua formatação de autonomia e independência, ele se mostra menos vulnerável a pressões. Decidir é da essência do Poder Judiciário, desagradando um dos lados em litígio.

Quando esse lado é muito poderoso, os danos à instituição podem ser pesados. Numa decisão, por exemplo, que contraria os interesses de um monopólio de comunicação, esse monopólio joga todo esse seu poder para atingir a credibilidade do Judiciário como instituição. Creio que aí aparece um outro grande debate que deve ser feito sobre até que ponto esse tipo de postura não corrói a nossa democracia.

I've got my head in the air and my feet on the groud


segunda-feira, 10 de outubro de 2011

Apesar da desigualdade na distribuição de terras produtivas, Brasil lidera ranking de combate à fome da ActionAid pela 3ª vez.

Matéria do Terra.


O Brasil lidera pela terceira vez o levantamento da organização não governamental (ONG) ActionAid, divulgado nesta segunda-feira, que lista os países que mais combatem a fome. Desta vez, o anúncio de mais investimentos para a agricultura familiar levou o Brasil ao topo do ranking. Malauí, Ruanda, Etiópia e Tanzânia completam as cinco primeiras posições.

O relatório lista resultados do Programa Fome Zero, que, segundo dados levantados, levou à redução da desnutrição infantil em 73% entre 2002 e 2008, e elogia a inclusão do direito à alimentação na Constituição Federal em fevereiro de 2010.



Dos arquivos do blog:

A iniciativa mais recente do País no combate à insegurança alimentar, segundo a ONG, foi o anúncio de R$ 16 bilhões para o Plano Safra da Agricultura Familiar 2011/2012, para investimentos na produção de alimentos, geração de renda no campo e organização econômica de agricultores familiares, assentados da reforma agrária e povos e comunidades tradicionais.

Apesar dos bons resultados, segundo a ActionAid, o Brasil precisa avançar na distribuição de terras, uma das mais desiguais do mundo. De acordo com o relatório, 56% da terra agricultável estão nas mãos de 3,5% dos proprietários rurais. Os 40% mais pobres têm apenas 1% dessas terras.

"O País precisa resolver a profunda desigualdade no acesso à terra e assegurar que os novos processos de crescimento não gerem novas exclusões por meio do deslocamento das populações. E ainda há 16 milhões de pessoas em situação de extrema pobreza, altamente vulneráveis à fome. Essas pessoas são profundamente excluídas, são necessárias políticas públicas muito específicas e desenhadas para esse grupo", avaliou o coordenador executivo da ActionAid Brasil, Adriano Campolina.

Segundo ele, pode ser compartilhada com outros países a experiência brasileira em iniciativas de transferência de renda e políticas de proteção social e segurança alimentar, como os programas de merenda escolar e de construção de cisternas em regiões semiáridas.

Na avaliação global, o levantamento aponta que apesar dos recentes avanços no combate à fome e à insegurança alimentar, o mundo está prestes a enfrentar um agravamento da crise de oferta de alimentos. Entre as causas estão os efeitos das mudanças climáticas e a perspectiva de aumento de preço dos alimentos, que deverá levar mais 44 milhões de pessoas à pobreza. De acordo com a ActionAid, a demanda de terras para a produção de biocombustíveis deve continuar inflacionando o preço dos alimentos.

De acordo com Campolina, a crise econômica também deve frear os esforços internacionais de combate à fome. "Em um ambiente de crise há menos recursos disponíveis tanto para a ajuda externa quanto para o investimento doméstico em agricultura, o que pode levar a uma diminuição dos recursos que poderiam ser destinados à agricultura familiar e sustentável. Apesar de que boa parte do que se ouviu até hoje sobre promessa de ajuda dos países ricos não constitui novos recursos", acrescentou.

A ONG sugere que o G20 (grupo das 20 maiores economias do mundo) inclua a crise alimentar na pauta de sua próxima reunião, em novembro, em Cannes, na França, e se comprometa, por exemplo, a garantir investimentos às pequenas propriedades dos países pobres e a frear a especulação de terras para a produção de biocombustíveis.

"O G20 tem que tomar as medidas concretas para cumprir a prioridade de combater a fome. A prioridade não pode ser salvar grupos financeiros que especulam com commodities agrícolas ao custo da fome das populações pobres. É preciso investir em pequenos agricultores que produzem alimentos para consumo local e dinamizam mercados domésticos, apoiar a criação de estoques de alimentos nacionais e regionais e controlar a especulação financeira com produtos agrícolas", disse o coordenador.

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Chapinha cultural: todos nós fazemos?


Santa Barbara Iansã de Jesus, de Adenor Gondim

“(…) Na verdade, Adriano [i.e., Ariano Suassuna], como Hermindo, luta por gente nova, com ideias novas, que arranquem os alunos de um marasmo pernicioso. Vai embora, dizendo: Já conversamos como dois latinos. – Não é a primeira vez que ouço estas palavras aludindo à sua latinidade. Que me importa que seja ou não latino? (...) De outra vez já me disse que a cultura luso-brasileira se baseava em Camões que, como português, tinha uma cultura humanística. Admiro Adriano por sua obra como admiro King-Kong por seu corpo, mas que diferença há entre o desejo de espichar o cabelo e a preocupação de não parecer uma espécie de selvagem poeta afro-brasileiro? Me conhece tão mal?”





A vida continua, de Adenor Gondim

quinta-feira, 6 de outubro de 2011

OI: cinco mitos sobre as mídias sociais

Artigo publicado pelo Observatório da Imprensa.

Lembrei deste outro texto, publicado pelo Novae há algum tempo, apesar da diferença de ótica entre os dois: Mauro Carrara: o meio é a mensagem e o Twitter de direita.

Cinco mitos sobre as mídias sociais
Tradução e edição: Leticia Nunes

O Washington Post publicou artigo do professor de estudos da informação e design Ramesh Srinivasan, da Universidade da California em Los Angeles, em que ele cita cinco mitos sobre as mídias sociais. São eles:

As mídias sociais dão poder às pessoas
Hoje, há mais de cinco bilhões de pessoas conectadas via telefones celulares, dois bilhões de internautas, 750 milhões de usuários do Facebook. É fácil interpretar estes números como indicadores de aumento de poder político e econômico. Mas o professor defende que, ainda que a tecnologia ajude bastante, não é suficiente para provocar mudanças na sociedade.

“Certamente há exemplos de como as novas tecnologias ajudam os menos favorecidos”, diz. Ele cita fazendeiros do Quênia e pescadores indianos que usam aplicativos de celular para driblar intermediários corruptos e conseguir preços em tempo real para seus produtos. Lembra de blogueiros que denunciam violações dos direitos humanos, da comunicação via redes sociais dos ativistas durante a onda de protestos nos países árabes, e da organização do movimento “Ocupem Wall Street”, contra o sistema financeiro americano, que teve início nas últimas semanas em Manhattan.

Mas para tirar melhor proveito da tecnologia, diz Srinivasan, as pessoas dependem de infraestrutura física e capital humano – incluindo aí eletricidade e educação.

Os governos facilmente monitoram e censuram as mídias sociais
O professor lembra que a internet é um meio muito mais difícil de ser monitorado do que veículos de mídia como televisão, jornais e rádio, que dependem, em grande maioria, de um sistema estabelecido de capital para funcionar. Com estes veículos tradicionais, governos podem mais facilmente detectar locais de transmissão ou impressão. Não é tão simples, por outro lado, monitorar uma plataforma formada por pessoas munidas de um laptop espalhadas pelo mundo.

O Facebook e o Twitter tornaram a Primavera Árabe possível
Ainda que as mídias sociais forneçam novas ferramentas de comunicação e engajamento a ativistas no combate à repressão, elas dificilmente são responsáveis por guiar movimentos sociais, diz Srinivasan, particularmente porque não necessariamente levam as pessoas às ruas. O professor diz que menos de 5% da população egípcia, por exemplo, usa Facebook, e menos de 1% tem conta no Twitter.

Mas ele concorda que as mídias sociais têm efeitos indiretos na mobilização de pessoas – ajudam lideranças ativistas a organizar suas redes e a mídia a moldar sua cobertura.

Apenas jovens usam as mídias sociais
No mundo ocidental, elas são usadas por pessoas de todas as idades. Nos EUA, 60% dos usuários do Facebook têm pelo menos 35 anos, e a média de idade de membros do Twitter é de 39 anos. Isso significa que grande parte da base de usuários destes sites não usava a internet até seus 20 anos de idade.

Segundo o Pew Research Center, dois terços de todos os adultos americanos usam redes sociais, e um estudo de 2010 descobriu que 42% dos americanos com mais de 50 anos estão incluídos nesta parcela.

As mídias sociais criam uma população global
Apesar da ideia de que a internet deveria unir pessoas de culturas e inclinações políticas diferentes, Srinivasan afirma que usuários de redes sociais raramente se aproximam de opiniões divergentes das suas.
As relações no Facebook, por exemplo, ocorrem pela ligação com amigos e interesses em comum. O sistema do site é programado para apresentar ao usuário informações e atualizações pelas quais – “acredita” o sistema – ele se interessa. A disposição das ferramentas das redes, como as comunidades e a possibilidade de ser “fã” de algo ou alguém, apenas reafirma visões políticas e culturais. Mudar isso é um desafio para as mídias sociais.

Falando de apolíticos...

Cartum do Adão Iturrusgara.

Sobre apolíticos:


Maringoni: desconfie dos técnicos!

Artigo de Gilberto Maringoni para o Carta Maior.

Desconfie daqueles que tentam lhe convencer da existência de medidas puramente técnicas em administrações públicas. Geralmente buscam encobrir o essencial: a ação governamental tem sempre ganhadores e perdedores. É sempre política.
Gilberto Maringoni

A virtual quebra da economia grega representa o grau máximo de submissão de uma autoridade pública aos ditames do mercado. Ou seja, ao mundo privado. Embora as relações de troca se deem na esfera pública, suas regras, dinâmicas e procedimentos acontecem a partir daquela pequena mas poderosa parcela da sociedade que concentra capital e, por conseguinte, poder.

O governo grego, capitaneado por um partido que tem a denominação de “socialista” – o que hoje não significa muita coisa – resolveu tomar lado no dilema colocado à sua frente. Se suspendesse os pagamentos do serviço de sua dívida pública, estaria ameaçado de sofrer uma retaliação brutal por parte dos bancos credores – em sua maior parte europeus – e de ser tratado como um pária no sistema financeiro internacional. Uma espécie de leproso da Idade Média, de quem nada ou ninguém quer se aproximar e muito menos oferecer linhas de crédito.

Uma escolha soberana desse tipo teria também efeitos devastadores para a economia européia. Uma moratória ou default por parte do país, além de arrastar bancos franceses e alemães, contaminaria toda a zona do euro (na dupla acepção do termo) e poderia dizimar a credibilidade da moeda única, dizimando economias maiores que enfrentam problemas fiscais de difícil solução.

O governo grego tomou a não decisão: aceitar todas as exigências das autoridades monetárias européias e dos bancos credores. Arrebentarão o país, mas serão reconhecidos como bons pagadores.


O bom senso da rendição
Entre as duas opções, a administração de George Papandreou escolheu a alternativa tida como a mais sensata. Na novilíngua global, bom senso quer dizer render-se às circunstâncias ou caminhar passivamente para o matadouro (apesar das multidões não quererem isso).

Alguns governos europeus, de esquerda e de direita, trafegam pela mesma senda diante do tsunami da crise. A administração de José Luis Zapatero, na Espanha, chegou ao cúmulo de pretender colocar uma apertadíssima meta de déficit público na letra da Constituição, para se adequar às orientações do sistema financeiro.

Um ponto tem unido governos de distintas colorações: arrocho fiscal, redução do papel social do Estado e absoluta prioridade ao atendimento das demandas do mercado. Cada vez mais se buscam “consensos” que tornam as ações econômicas de distintos partidos no poder quase indiferenciadas entre si.


Neutras e limpas
A justificativa para o grande público é que as medidas adotadas seriam “técnicas” e nada teriam a ver com a esfera política. Algo semelhante ao que é decidido nas reuniões do Copom, do Banco Central brasileiro. Elevações estratosféricas das taxas de juros seriam decisões tomadas por um pessoal especializado que não se deixa dominar pelas paixões da política. Paixão, todos sabem, é aquela força estranha, algo irracional, que nos deixa em estado catatônico e nos faz pensar o dia inteiro na pessoa amada.

Opções técnicas seriam feitas em ambientes neutros, limpos, de pura racionalidade, quase esterilizados, repletos de indicadores, estatísticas, balancetes e várias engenhocas de última geração. A decisão seria tão isenta quanto trocar o pneu furado de uma bicicleta.

O reino da política, por sua vez, seria sujo, cheio de interesses inconfessáveis, corrupto, parcial e tocado por gente da pior espécie. Se fosse num filme, poderia ser retratado como um local esfumaçado, repleto de vícios, drogas, álcool e negociatas variadas. Pior ainda se fosse contaminado pelo vírus da ideologia, essa praga que só serve para confundir as coisas e evitar que se faça o que tem de ser feito. Aliás, este era o slogan da campanha de Mario Covas (PSDB-SP) à reeleição para governador, em 1998: “Fazendo o que tem que ser feito”.

A diretriz tecnicista é tão óbvia e de fácil entendimento, que costuma se tornar popular. Por isso, o prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, gerou enorme empatia ao dizer que seu novo partido, o PSD. Ele “não é de direita, nem de esquerda e nem de centro”. É uma agremiação que fará o que tem de ser feito, um partido sem esse vício pernicioso da política. Um partido técnico, enfim.


É a política, é a política!
Poucos se aventuram atualmente a investir contra esse cipoal de meias verdades tecnicizantes.

Um deles é o ex-presidente Lula. Ele disse, durante a solenidade em que recebeu o título de doutor honoris causa do Instituto de Estudos Políticos de Paris, no último dia 27, que a crise econômica se resolve essencialmente no terreno da política. "A hora não é de negar a política, e sim fortalecê-la”, completou ele.
A frase toca num dos pontos mais caros aos conservadores e às lideranças políticas que buscam justificar medidas impopulares. Para eles, cortes orçamentários, restrições salariais, taxas de juros estratosféricas, entre outras iniciativas, seriam medidas “técnicas”, não “contaminadas” pelas “paixões políticas ou ideológicas”. Age-se como se existisse uma economia desprovida de ganhadores e perdedores, algo distante do arbítrio das decisões humanas.


História antiga
A distinção entre a política e medidas tidas como técnicas não nasceu com os ultraliberais de hoje. Como dizia o ex-governador Leonel Brizola, essa formulação vem de longe.

Uma das principais referências teóricas do pensamento conservador em economia é o Tratado de Economia Política, escrito pelo francês Jean-Baptiste Say (1767-1832),. Escrito em 1803, o trabalho é tido como um dos pilares do liberalismo. Say é um seguidor de Adam Smith (1723-90).
Say coloca no papel teses que se tornaram caras aos liberais ao longo dos séculos, como, por exemplo, a completa separação entre economia e política:

“Durante muito tempo, confundiu-se a Política propriamente dita, a ciência da organização das sociedades, com a Economia Política, que ensina como se constituem, se distribuem e se consomem as riquezas que satisfazem as necessidades das sociedades. Entretanto, as riquezas são essencialmente independentes da organização política. Desde que bem administrado, um Estado pode prosperar sob qualquer forma de governo”.

Em certa medida, é o que o economista liberal brasileiro Eugenio Gudin (1886-1986) defende em 1938, em um texto chamado Aspecto econômico do corporativismo brasileiro. Ali ele comenta a história do capitalismo nos séculos XIX e XX:

“Quem acompanhou a marcha e a evolução do chamado regime capitalista de 1875 a 1914, até rompimento da Guerra Mundial, constatou que o enriquecimento geral prosseguia seu ritmo natural e benéfico, a difusão de capitais se processava com regularidade, as condições de trabalho melhoravam por toda parte, o comércio internacional melhorava todos os anos. E se guerra houve, foi inteiramente gerada pelas paixões e ambições políticas e militares e em que os fatores econômicos menor papel representaram, essa foi a guerra de 1914, que desencadeou sobre o mundo uma das maiores crises econômicas da história”.

Gudin também separava economia de política. O conservadorismo vê a sociedade formada por partes estanques entre si.

Desconfie dos técnicos. O Brasil de 1964 estava cheio deles. Eram todos apolíticos, mas não vacilaram em aderir ao golpe triunfante e compor a tecnoburocracia da ditadura. Hoje encastelam-se no sistema financeiro, têm colunas na imprensa e continuam defendendo privatizações, desregulamentações, superávits primários, arrochos variados e recomendando fazer o que tem de ser feito.

Todos são sensatos, isentos e racionais. Longe da sujeira da política.

Gilberto Maringoni, jornalista e cartunista, é doutor em História pela Universidade de São Paulo (USP) e autor de “A Venezuela que se inventa – poder, petróleo e intriga nos tempos de Chávez” (Editora Fundação Perseu Abramo).

terça-feira, 4 de outubro de 2011

O Ministério Público quer saber: porque o carro é tão caro no Brasil?

A notícia abaixo foi publicada no sítio da própria Procuradoria Geral da República.

Dos arquivos do blog: Afinal, o que encarece o carro no Brasil?

4/10/2011

Objetivo é apurar possível lucro abusivo das montadoras de automóveis

A 3ª Câmara de Coordenação e Revisão (CCR) do Ministério Público Federal, em sua 7ª sessão ordinária, aprovou diligência que solicita à Secretaria de Acompanhamento Econômico (SEAE) do Ministério da Fazenda investigação sobre eventual lucro abusivo das montadoras de automóveis.  A situação se verifica em relação a veículos vendidos no Brasil, quando comparados com os mesmos carros vendidos no exterior. O MPF também quer a revisão da chamada Lei Ferrari (Lei 6.729/1979), que dispõe sobre a concessão comercial entre produtores e distribuidores de veículos automotores no país.

O pedido de investigação ao Ministério da Fazenda é motivado pelo envio, de forma sigilosa, de uma cópia de matéria jornalística enviada à Procuradoria da República no DF. As reportagens noticiam o alto preço cobrado pela venda de veículos no Brasil em comparação com outros país e sugerem, ainda, que o alto preço seria decorrência do lucro abusivo praticado pelas montadoras brasileiras. Para o coordenador da 3ª CCR, subprocurador-geral da República Antonio Fonseca, “dentro da atribuição de zelar pelos princípios constitucionais relativos à atividade econômica e à defesa do consumidor, cabe ao MPF provocar os órgãos federais competentes a voltar sua atenção para o tema”.

De acordo com o voto coletivo aprovado na 3ª CCR, “a Lei Ferrari pode ter tido algum papel, há 30 anos, na época da reestruturação dos mercados de veículos no Brasil, numa época em que vigia uma economia de controle de preços. Mas hoje existem fortes suspeitas de que essa lei é desnecessária e até prejudicial”. Assim, o MPF, no âmbito de suas atribuições de zelar pela observância dos princípios constitucionais relativos à atividade econômica, decidiu requisitar à SEAE/MF investigar, em até 180 dias, questões relacionadas à importação de veículos, como a execlusividade na venda de veículos novos e a proibição de restrições territoriais na comercialização.

Para a 3ª CCR, órgão de cúpula do MPF dedicado à defesa dos direitos do consumidor e à proteção da ordem econômica; além das barreiras à importação, da carga tributária e da mão-de-obra; os preços altos podem ser indício de falhas de mercado e de regulamentos obsoletos, como a chamada Lei Ferrari. Nesse sentido, a 3ª CCR também irá solicitar ao Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) que desenvolva estudos para verificar se existe conveniência ou não na manutenção da Lei Ferrari. De posse dos estudos fundamentados, o MPF avaliará a possibilidade de provocar outros órgãos governamentais, seja para aprofundar a investigação de eventuais falhas de mercado ou para considerar a revisão.

Saul Leblon: quem ronda é o dragão da deflação.

Texto de Saul Leblon para o Blog das Frases, em Carta Maior.

Mais sobre inflação, nos arquivos do blog:
A propaganda do PPS e a volta da inflação


Na última 6ª feira, em discurso a empresários, em São Paulo, a Presidenta Dilma Rousseff rebateu as críticas do conservadorismo, reiteradas um dia antes pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. Segundo o tucano, a decisão brasileira de reduzir em meio ponto a taxa de juro mais alta do mundo teria sido 'precipitada'.

A resposta da Presidenta veio em tom de alerta:"...diante da crise e da ameaça de deflação e depressão em algumas economias desenvolvidas, (estamos abrindo espaço para que o BC) possa iniciar um ciclo cauteloso e responsável de redução da taxa básica de juros. Não é admissível que, se de fato se configure uma recessão e um processo deflacionário no resto do mundo, nós aqui estejamos sem levar isso em conta'.

A deflação temida pela presidenta e desconhecida do sociólogo cosmopolita é uma espiral baixista de preços que se auto-alimenta.

Trata-se de uma das doenças mais graves do capitalismo.

Para muitos economistas, mais grave que a sua contrapartida de sinal trocado, a hiperinflação, que costuma ser equacionada com a arma clássica do coquetel conservador: recessão, arrocho salarial e juros estratosféricos.

A deflação, ao contrário se instala dentro da recessão. É uma espécie de síntese das contradições do sistema, que assume a forma de uma paralisia progressiva. Ataca, sobretudo, metabolismos com baixa resistência, caso dos EUA hoje, onde a taxa de juro real já é negativa e os recursos de intervenção do Estado estão imobilizados politicamente.

Se as taxas de juros são negativas quem tem dinheiro prefere guardá-lo em segurança no cofre do Tesouro norte-americano a correr o risco de emprestá-lo em troca de rendimentos mínimos e incertos.
Essa escolha quando feita pelos bancos amplifica a contração da atividade econômica pela retração do crédito. O crédito é a alma e o motor do capitalismo. Sem ele o sistema desfalece. É o que tem ocorrido nos EUA, onde mais de US$ 1,3 tri estão empoçados nos caixas dos bancos.

Historicamente, a tentativa de quebrar esse círculo de ferro, nem sempre bem sucedida, inclui doses cavalares de gasto fiscal em obras públicas, oxigênio negado à paralisia norte-americana pelo radicalismo neoliberal .

Na Europa há espaço para novos cortes de juros (hoje em torno de 1,5%). Mas o predomínio de burocratas ortodoxos e governos conservadores, entre os quais se incluem socialdemocratas colonizados pelo neoliberalismo, restringe o uso desse instrumento, tanto quanto a alavanca do investimento público.

O elevado custo de uma deflação pode ser inferido dos desdobramentos causados pela explosão da bolha imobiliária nos EUA, em 2008, que até hoje não cessaram.
A espiral descendente dos preços dos imóveis criou um fosso entre o valor da dívida hipotecária das famílias e o valor de mercado de suas residências. Em muitos casos, o patrimônio passou a valer a metade da dívida.

Em apenas um mês, em novembro de 2008, o preço médio dos imóveis residenciais nos EUA caiu mais de 20%.

Não raro, isso foi acompanhado da perda do emprego ou da troca involuntária por outro de salário inferior. O peso da dívida adquiriu assim um peso insuportável no orçamento familiar.

O efeito imediato é a redução da demanda, que agrava a recessão, que deprime ainda mais o valor dos imóveis. E assim sucessivamente.

Para desafogar os mutuários seria necessário estender o processo de deflação ao valor dos empréstimos, impondo perdas equivalentes aos bancos, construtoras, investidores, ações de companhias ligadas à construção etc .

A resistência do capital financeiro a esse compartilhamento de perdas é uma das causas da encruzilhada paralisante enfrentada pela crise mundial nesse momento. Toda ela está amarrada no impasse em torno de uma conta de chegar explosiva entre passivos e ativos Ou seja, entre a catastrófica massa de capital fictício sedimentada pela desregulação financeira do ciclo neoliberal --nas mãos de fundos, bolsas, investidores, empresas, bancos etc-- e a riqueza real disponível. Se a referencia for o PIB mundial essa desproporção é de 10 para 1.

Sem impor perdas ao capital fictício o que sobra é um ajuste selvagem que se faz via desemprego, perda salariais e falencia de nações. É o que assistimos nesse momento.

Alerta recente da OIT informa que o mundo já tem mais de 200 milhões de desempregados. A oferta de trabalho cresce aquém do crescimento populacional. O estoque incha em vez de diminuir. A retração do mercado sinaliza um déficit de 40 milhões de empregos entre 2011 e 2012.

Fecha-se o círculo de ferro: consumidores não compram por falta de dinheiro ou pela expectativa de que os bens venham a sofrer novas reduções. Bancos não emprestam porque o juro é baixo e os riscos são altos. Empresas não produzem porque não há demanda - e não investem porque suas máquinas estão ociosas Quem tem estoque fica encurralado por dívidas com fornecedores que o retorno das vendas já não cobre. O conjunto gera novas quedas de preços reproduzindo a mecânica da deflação em patamares cada vez mais subterrâneos. Mas as dívidas financeiras resistem blindadas pelo poder político dos bancos e grandes corporações.

Os indicadores de preços nos EUA ou na Europa não apontam ainda um cenário de deflação. Mas as previsões do FMI são de recuos pronunciados. Estimativas do Fundo feitas no início de setembro para a zona do euro apontavam uma taxa de inflação de 2,5% para este ano, caindo para 1,5% em 2012. Já nos Estados Unidos, a inflação passaria de 1,6% a 3% até o final de 2011, para recuar a 1,3% em 2012.
Expectativas de quedas mais pronunciadas ganham força até mesmo entre aqueles que costumam manifestar confiança nas virtudes auto-depurativas dos mercados. O presidente do banco central de Israel é um deles.

Ortodoxo de carteirinha, ex-dirigente do FMI, Stanley Fischer reduziu a taxa de juros do país de 3,25% para 3% ao ano, mesmo com a inflação acima da meta oficial. Fischer foi taxativo ao se justificar. A inflação nesse momento, explicou, é questão "irrelevante". E advertiu:" em 2012 o mundo pode ter deflação, não alta de preços".

Há indicativos fortes nessa direção. Eles partem de uma das roletas preferidas do capital especulativo, as bolsas de commodities. Embora a base de comparação ainda seja elevada, as cotações das commodities agrícolas e minerais fecharam setembro com as maiores quedas desde 2008. A soja teve um recuo de 16%; o cobre acumulou uma perda de 25% em relação ao pico de alta em 2010.

À fuga de especuladores ariscos somam-se agora sinais crescentes de desaceleração da economia chinesa, cuja produção industrial acumula tres quedas mensais consecutivcas. O que acontecer com a economia chinesa nos próximos meses terá impacto decisivo no movimento deflacionista das matérias-primas, que tem na China o maior importador mundial.

A precaução da Presidenta Dilma em armar o país contra o risco de uma deflação - incluindo-se uma redução mais acentuada da Selic - é mais que justificável. Uma vez iniciado é muito difícil reverter um processo deflacionário, mesmo em países dotados de grande poder de fogo fiscal.

A deflação japonesa, por exemplo, perdurou por toda a década de 90. O Estado japonês investiu US$ 1,4 trilhão em obras públicas, incluindo desde garagens urbanas a muros de contenção contra tsunamis, passando por pontes de duvidosa relevância. Entre elas a maior ponte pênsil do mundo entre Kobe e a ilha de Awaji. A obra custou US$ 7,4 bi e, segundo Paul Krugman, registra um tráfego desprezível de apenas 4 mil veículos por dia.Nem assim o Japão conseguiu engatar um novo ciclo de expansão sustentável.

Na deflação norte-americana de 29, os preços chegaram a cair 25%, em média. O desemprego saltou de 1,5 milhão de pessoas, em 1929, para 12,8 milhões em 1933, atingindo 24,9% da força de trabalho; em 1939 era ainda de 17%. O PIB diminuiu de US$104 bi para US$ 56 bi, entre 1929 e 1933.

Os EUA contaram com Roosevelt , o New Deal e uma relação de forças polarizada pela expansão dos ideais socialistas que arrancou concessões do capitalismo em benefício da renda, do emprego e do consumo. Mesmo assim foi preciso uma guerra mundial para que o sistema reencontrasse o caminho do pleno emprego e da produção.

Lá vai São Francisco...