Sinais positivos de mudança de costumes.
Uma maior agilidade na investigação e no julgamento de crimes cometidos pelos políticos com foro privilegiado pode representar uma revolução de costumes no país. Por banal que possa parecer, essa é a importância a ser dada ao acordo feito entre o Supremo Tribunal Federal (STF) e a Polícia Federal (PF) - pelo qual prometem concluir inquéritos e proceder ao julgamento de deputados e senadores suspeitos ainda durante o mandato que dá a eles o privilégio de serem julgados apenas pelo STF. A agilidade no inquérito e no julgamento de crimes cometidos por políticos representa, na prática, excluir os fichas sujas das eleições sem que para isso se tenha que convencer parlamentares a votar contra seus interesses.
O "foro por prerrogativa de função" é o STF, quando se trata de ações contra congressistas, ministros de Estado e presidente da República. No caso dos governadores e desembargadores, o foro é o Superior Tribunal de Justiça (STJ); para os deputados estaduais e prefeitos, são os Tribunais de Justiça estaduais.
Esse privilégio é quase uma garantia de impunidade - lógico, para quem deve explicações à Justiça. O julgamento, para aqueles que têm esse interesse, pode ser indefinidamente procrastinado. Os tribunais superiores não são aparelhados para as tarefas de investigação criminal nem vocacionados para isso; ser alçado, pelo voto, a um cargo no Congresso (ou a um ministério, por nomeação do presidente da República), ou deixar de ser deputado, senador ou ministro, desloca os processos contra o denunciado para o Supremo ou os devolve à Justiça comum. Assim, se adia a conclusão do inquérito e do julgamento até a prescrição do crime. Além deste, a defesa tem outros inúmeros recursos protelatórios. Com manobras várias à sua disposição, o trabalho de um advogado de defesa acaba se resumindo a adiar indefinidamente a ida de seu cliente às barras do tribunal.
O convênio entre STF e PF prevê que o inquérito e o julgamento andem rápido o suficiente para serem concluídos no período do mandato do parlamentar, isto é, antes que uma não reeleição remeta o processo à Justiça comum, ou antes que o político se credencie a um novo mandato popular. O político condenado torna-se inelegível.
Além de decisões de ordem processual que encurtarão o período em que o inquérito circula entre o Ministério Público, a PF e o STF, que pode durar anos segundo as regras vigentes, o Supremo vai regulamentar uma lei aprovada em 2009, que permite aos ministros da mais alta Corte judicial convocar juízes na área criminal para auxiliá-los na coleta de provas e para ouvir testemunhas. Sem esse recurso, os ministros são obrigados a acionar juízes nos Estados - que têm as suas próprias tarefas e responsabilidades.
O acordo não resolverá num passe de mágica o problema. Atualmente, existem no STF 6.997 processos criminais contra deputados, senadores e ministros, sendo que 33,3% tramitando há mais de quatro anos. Das ações penais, 42,3% estão tramitando há mais de 10 anos. É um imperativo democrático, todavia, que o STF resolva esse passivo de processos e imprima aos novos uma dinâmica que torne regra o julgamento dos políticos antes que eles submetam novamente seus nomes ao eleitor. Pela atual legislação, somente o trânsito em julgado de ações contra autoridades federais torna o político inelegível, isto é, o descredencia a disputar um mandato popular.
A preocupação do STF é mais um sinal de que a cultura da impunidade da elite política brasileira está com os dias contados. Outro forte indício de que o país caminha para uma realidade em que não existirão mais fortes e fracos perante a Justiça, mas igualdade de direitos, foi a prisão do (agora licenciado) governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda (ex-DEM) e, antes disso, as cassações dos governadores Cássio Cunha Lima (PSDB-PB), Jackson lago (PDT-MA) e Marcelo Miranda (PMDB-TO) - essas últimas por crime eleitoral julgado pelo Tribunal Superior Eleitoral e confirmado pelo STF. Mas há também sinais de que há iguais que não são tão iguais assim. Por exemplo, nos lugares de Lago e Miranda, assumiram os segundos colocados na disputa de 2006, Roseana Sarney (PMDB-MA) e Carlos Gaguim (PMDB-TO), que respondem por crimes eleitorais semelhantes aos dos cassados. Não foram julgados até hoje e concorrem à reeleição.
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