Matéria do Uol Educação.
Simone Harnik
Em São Paulo
Depois de se formar em administração em Belo Horizonte, Bruno Lucio Santos Vieira, 22, ingressou no mestrado em relações internacionais na Ohio University, nos Estados Unidos. Hoje, no curso, o estudante dedica seu tempo a disciplinas como história econômica norte-americana e mercados financeiros.
A biografia resumida acima pode parecer com a de algum brasileiro bem-nascido e cheio de oportunidades. No caso de Bruno, no entanto, cada passo tem sido uma batalha: filho do aposentado Henrique Barbosa Vieira, 68, e da dona de casa Neide Lúcia Santos Vieira, 56, o rapaz concluiu a educação básica toda em escola pública, fez a graduação pelo Prouni (Programa Universidade para Todos) no Centro Universitário Una e ganhou, pelo bom desempenho, desconto para a pós-graduação.
No entanto, há um semestre na terra de Obama, e ainda que tenha a bolsa de estudos, os custos de vida têm comprometido o futuro acadêmico do jovem. A cada mês, ele fica mais 600 dólares no vermelho – o que corresponde a aproximadamente R$ 1.100. "Quando vim, não ficou claro que haveria tantos gastos, e eles comprometeram o orçamento", conta.
E a família não tem como ajudar. "Meu marido ganha um salário e meio. Acabou de passar por um câncer de próstata. Para complementar a renda, ele recolhe garrafas, e eu lavo para vendermos", diz Dona Neide, que se esforça para segurar a saudade e as lágrimas sempre que fala com o filho. "Ele é o meu caçula e toda a vida foi exemplar. Muito carinhoso. Mas estou muito triste com as dificuldades que ele está passando."
Ajuda dos novos amigos
Mesmo trabalhando para a faculdade – dentro dos limites da lei – tem sido bem difícil bater a quantia necessária a cada mês, diz o jovem. E as economias que fez enquanto trabalhava no Brasil já se foram.
A sobrevivência tem dependido da boa vontade dos novos amigos nos EUA. Dois ucranianos e um espanhol têm financiado o aluguel e a comida para Bruno e sua mulher, Poliana. O casal ainda consegue almoçar de graça duas vezes por semana em igrejas da cidade.
O casamento, que não completou um ano terá de resistir à distância. Com a falta de dinheiro, Poliana já está de malas prontas para retornar ao país.
Nem luxo nem lixo
O mobiliário da casa que Bruno divide com os europeus recebeu vastas contribuições do desperdício ou do desapego da comunidade de Ohio. "Quando alguém nos pergunta onde compramos armário, mesas, cadeiras, sofá, sempre brinco que foi no 'Trash.com' [em inglês, "trash" quer dizer lixo]. Achamos também panela, pratos, copos, talheres", relata Bruno, que chegou a receber até doações de comida.
Primeiro da turma
Durante a faculdade, a performance do jovem foi alvo de elogios dos docentes. Segundo a coordenadora do curso de administração do Una, Christiana Metzker Netto, ele "tem muito potencial".
"Bruno teve 94 pontos [em cem] de média geral. Tirou de letra a faculdade e foi um aluno exemplar. No trabalho final, tirou 99 pontos – e as médias costumam ser bem mais baixas", revela. "O curso também pede 60 horas de atividades complementares, que os alunos demoram a cumprir. Bruno fez 255 horas".
O empenho rendeu troféu de melhor aluno do curso, mas não foi suficiente para garantir a estadia no mestrado. E o rapaz tem recorrido ao seu passado acadêmico para buscar auxílio – concorre a novas bolsas, ainda sem certezas.
O mais jovem de cinco irmãos, primeiro a se formar na faculdade e a ir ao exterior, é admirado pela família e espera voltar com o mestrado concluído. "Todo herói tem de ter um pouco de louco, tem de arriscar. Pensei que essa podia ser a minha única chance de continuar estudando", diz.
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