Segue artigo publicado pelo Terra Magazine, com alguns grifos meus.
O original está aqui.
O fim da recessão
Julio Gomes de Almeida
De São Paulo
Aquela crise iniciada a nível global há precisamente um ano atrás, o Brasil conseguiu digerir. Mais do que isso, ao que tudo indica a economia do país voltou ou está a caminho de voltar a desfrutar do dinamismo que antecedeu a crise, exceto no que diz respeito às exportações que já estão melhorando, mais porque caíram muito desde o início da crise e não porque está sendo recomposta a capacidade brasileira de abastecer mercados externos, especialmente no caso de produtos manufaturados.
Isso significa dizer que se não houver outra "rodada" da crise internacional, o mercado interno brasileiro que já vinha sustentando o crescimento econômico do país voltará plenamente a exercer esse papel.
É reconhecido a importância de estabilizadores que ajudam amortecer as oscilações da economia brasileira e que serviram para suavizar o contágio à crise internacional. Esta teria tido um impacto maior, caso não operassem esses estabilizadores que dão sustentação, sobretudo, ao setor de serviços. No caso, por exemplo, de "administração, saúde e educação públicas", um segmento de serviços que representa 14% do PIB total brasileiro e é integralmente estatal, a trajetória foi de crescimento ininterrupto.
Daí que o setor de serviços tenha declinado pouco no último trimestre do ano passado (-0,5%), enquanto a economia brasileira assistia a um declínio do PIB de 3,5%. Também explica o desempenho positivo nos trimestres seguintes, de 0,6% no primeiro trimestre e de 1,2% no segundo trimestre.
A despeito desses estabilizadores e do desempenho todo peculiar de serviços, a recuperação do crescimento do PIB no segundo trimestre de 2009 com relação ao primeiro (1,9%), que simboliza o fim da recessão para economia brasileira, o decisivo determinante foi a recuperação da indústria.
Nesse caso, o crescimento real foi de 2,1% após dois trimestres anteriores de quedas muito fortes (-3,2% e - 8,0%). Em outras palavras, se o setor de serviços serviu como um "escudo" contra a crise, a economia brasileira teve na reativação da indústria o fator determinante de sua saída da crise no segundo trimestre de 2009.
E a melhora do setor industrial veio da performance que o país soube preservar em seu mercado interno. Em parte, porque adotou medidas de redução de impostos que beneficiaram amplas cadeias produtivas e, por outro lado, porque não voltou atrás em programa de investimento público e de complementação da renda.
Deve ser sublinhado que o avanço muito elevado das exportações de bens e serviços no segundo trimestre de 2009 (+14,1%) foi capturado quase exclusivamente pelas vendas externas de produtos básicos, beneficiando muito pouco os produtos manufaturados. É provável um aumento parcial das vendas externas de manufaturas nessa segunda metade do ano, se for mantido o retorno ao crescimento das economias centrais. Mas, no período em tela, o mercado externo pouco contribuiu para a retomada da indústria.
O investimento também ainda não contribui positivamente. No trimestre, teve um crescimento zero, o que não deixa de ser um resultado positivo porque sugere que a inversão no país já caiu tudo o que tinha que cair com a crise internacional. Os declínios foram de 12,3% e 9,1%, e é possível que sejam apurados índices positivos já no terceiro trimestre. Mas, o alto índice de ociosidade da indústria faz crer que uma recuperação mais efetiva da inversão do investimento venha a tardar um pouco mais, apresentando-se somente no ano que vem.
Do lado do gasto, o consumo das famílias sustentou a recuperação, com variação no segundo trimestre de 2009 (+2,1%) substancialmente superior ao primeiro trimestre (+0,6%) e ao terceiro trimestre do ano passado, quando houve recuo de 1,4%.
Ajudaram nesta recuperação do consumo a relativa preservação do emprego em setores não industriais e a evolução menor, porém, ainda positiva do rendimento real das pessoas em parte decorrente de políticas como o Bolsa Família e aumento do salário-mínimo. No entanto, foi o retorno do crédito das famílias a mais relevante fonte da mudança. Como é de se esperar a continuidade do afrouxamento da restrição do crédito nos meses finais desse ano, o consumo familiar deverá manter essa direção positiva, mesmo que o governo exerça o seu plano de retirada dos incentivos fiscais para os setores produtivos.
Júlio Gomes de Almeida é professor da Unicamp e ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda.
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