sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Rio, a cidade que faz a alma cantar

Paixão por uma cidade ou um país - o patriotismo, enfim - pode ser mesmo uma doença bem infantil. E, sim, feliz ou infelizmente, eu sou doente.




PS: o vídeo me chegou por uma publicação do Gizmodo. É lindo, mas fica ainda melhor quando se tira o som do Vimeo e o assiste ouvindo o Samba do Avião.

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Bolha imobiliária?

Abaixo, o trecho do boletim Conjuntura em Foco, do IPEA, que trata dos riscos de uma bolha imobiliária no Brasil. A íntegra está disponível aqui (em PDF).

Boletim Conjuntura em Foco do IPEA: Crédito às pessoas físicas, inadimplência e a crise econômica internacional foram os temas principais (trecho)

O crescimento do crédito e, mais recentemente, da inadimplência na economia brasileira vem suscitando preocupações com a evolução do atual nível de endividamento das famílias. Por isso, torna-se importante entender se o movimento recente dessas séries no Brasil assemelha-se ao ocorrido em determinados países, como, por exemplo, os Estados Unidos – onde a expansão irresponsável do crédito resultou na formação da chamada “bolha imobiliária”. Não se pretende, neste texto, empreender uma análise minuciosa sobre os determinantes da crise internacional, as apenas examinar de forma comparada o recente fenômeno do avanço do crédito e da inadimplência na economia brasileira.



Nesse sentido, voltando ao caso dos Estados Unidos, no período anterior a 2007, o sistema financeiro concedia crédito (notadamente, financiamento imobiliário) a pessoas físicas que não percebiam renda compatível com o serviço da dívida (subprime). Até mesmo imigrantes ilegais, que não tinham documentos do país nem comprovação formal de renda, conseguiam financiar a compra da casa própria com certa facilidade. Com a ampliação do crédito, o preço dos imóveis – num cenário de crescimento econômico – aumentou continuamente ao longo de vários anos.

A legislação permitia – e o sistema financeiro estimulava – que a pessoa que tivesse financiado a compra de um imóvel pudesse renegociar o contrato de empréstimo (muitas vezes com outro agente financeiro), com base nas novas cotações do mercado imobiliário, obtendo, assim, volumes superiores de crédito – o percentual de contratos de refinanciamento em que isso acontecia chegou a alcançar 72,9% do volume total, como mostra o gráfico 1.

Gráfico - Parcela dos refinanciamentos imobiliários dos Estados Unidos na qual o devedor recebeu dinheiro do banco com o novo contrato (cash out refinancing)
Gráfico 1
Assim, as famílias passaram a alavancar suas posições devedoras com vistas à ampliação do consumo e/ou à aquisição de novos imóveis. Quando, por uma série de razões, os preços dos imóveis começaram a cair, a dinâmica se inverteu. Os bancos executavam as garantias, vendiam imóveis, não conseguiam reaver todo o saldo devedor e, ainda, aprofundavam a tendência de queda dos valores imobiliários. Desse modo, a inadimplência de contratos de crédito no setor imobiliário da economia norte-americana tornou-se um importante componente da crise econômica (gráfico 2).

Gráfico - Taxa de inadimplência do sistema financeiro dos EUA
Gráfico 2
No caso da economia brasileira, o crédito tem crescido a taxas elevadas há alguns anos. Não obstante, o endividamento das famílias com o sistema financeiro (medido em relação à renda acumulada dos últimos doze meses) ainda é baixo comparativamente ao nível alcançado nas regiões atualmente em crise (gráfico 3). Mesmo o crédito imobiliário, que cresceu bem acima da média das demais modalidades nos últimos anos – passando de 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB) no início de 2007, para 4,5% do PIB no final de 2011 e 5,5% do PIB em junho deste ano – ainda se encontra num patamar muito inferior ao apresentado pelos Estados Unidos (65% do PIB) e mesmo por países emergentes, como, por exemplo, a África
do Sul (27% do PIB). [1]

Gráfico - Endividamento das famílias com o sistema financeiro (EUA, Reino Unido, Africa do Sul e Brasil)
Gráfico 3
Na verdade, o dado que suscita maior preocupação (em função do forte ritmo de crescimento nos últimos anos e do alcance de um patamar elevado na comparação internacional) é o de comprometimento de renda das famílias com o serviço das dívidas (juros e amortizações) junto ao sistema financeiro, o qual, não obstante, se mantém em torno de 22% desde o segundo semestre de 2011 (gráfico 4). De acordo com dados divulgados no relatório do Fundo Monetário Internacional (FMI) sobre o Brasil (no 12/191 de julho de 2012), o nível de comprometimento da renda no Brasil está alto na comparação com outros países emergentes da América Latina; por exemplo, em relação ao México (em torno de 5%) e Chile (algo como 15%) – no caso dos Estados Unidos, o nível de comprometimento da renda estava em 11% no primeiro trimestre deste ano, segundo dados do FED.

Gráfico - Comprometimento de renda das famílias com o serviço das dívidas com o Sistema Financeiro Nacional - Brasil
Gráfico 4
Uma hipótese que tem sido aventada no debate recente é que esse elevado grau de comprometimento da renda, juntamente com a alta da taxa de inadimplência (examinada a seguir), pode estar limitando o avanço do mercado de crédito no Brasil como reação à flexibilização da política monetária.

Por outro lado, de acordo com dados do BCB, o saldo das parcelas a vencer no curto prazo representam 43% das dívidas de pessoas físicas com o sistema financeiro. Se forem acrescentados também os valores referentes ao crédito com vencimento no médio prazo (361 a 1.088 dias), chega-se a mais de 73% do total. Isso significa, portanto, que o elevado grau de comprometimento da renda das famílias no Brasil, da mesma forma que cresceu rapidamente, também pode cair em pouco tempo. De fato, os últimos dados disponíveis, de maio de 2012, apontam para uma gradual redução desse indicador. Em primeiro lugar, tal queda tende a se acelerar com a trajetória declinante das taxas de juros e o processo crescente de renegociação das dívidas. Em segundo lugar, o próprio denominador da razão constituinte desse indicador, o rendimento do trabalho, tem permanecido em alta apesar do agravamento recente da crise internacional. Finalmente, o aumento da participação do crédito habitacional tende a aumentar o prazo médio de pagamento das dívidas e, com isso, a reduzir os desembolsos mensais com serviços da dívida em relação ao nível de endividamento da população.

Os dados sugerem que o aumento recente do grau de comprometimento da renda com juros e amortizações também está positivamente correlacionado com a alta da taxa de inadimplência (gráficos 4 e 5). Entretanto, para melhor entender o movimento recente de alta da inadimplência na economia brasileira, torna-se necessário, antes de tudo, examinar as mudanças institucionais implantadas nos anos 2000, fundamentais para o avanço do crédito no período subsequente. Dentre tais mudanças, destacam-se:

• a regulamentação do crédito consignado (Lei no 10.820, de 17/12/2003), que ampliou o acesso de trabalhadores com carteira assinada e aposentados a uma linha de crédito com juros bem menores que os do crédito pessoal tradicional;
• a criação do Sistema de Informações de Crédito do Banco Central (SCR), que deu mais segurança ao sistema financeiro. [2] A coleta de informações para o SCR iniciou-se em maio de 2002;
• a Resolução no 3.005, de julho de 2002, do BCB produziu alterações na contabilização do Fundo de Compensação de Variações Salariais (FCVS), que implicaram o aumento da parcela de recursos da poupança destinada ao financiamento habitacional;
• a aprovação da Lei no 10.931, de 2/8/2004, que disciplinou a aplicação da alienação fiduciária criada em 1997, simplificando a retomada do bem dado como colateral para o empréstimo, e instituiu o valor incontroverso – instrumento que estabelece, nos casos de disputas judiciais, a continuidade do pagamento da parte da prestação não contestada; e
• a mesma Lei no 10.931 instituiu o patrimônio de afetação, que consistiu na adoção de um patrimônio próprio para cada empreendimento, e o regime especial de tributação (RET) do patrimônio de afetação, para blindar o empreendimento em relação a débitos do empreendedor dando segurança aos compradores de imóveis na planta em caso de problemas financeiros da construtora.

Gráfico - Taxa de inadimplência acima de 90 dias em relação ao total da modalidade das operações de crédito
Gráfico 5
Essas importantes reformas institucionais tiveram impactos diferentes em cada categoria de crédito. A normatização do crédito consignado resultou numa maior oferta de crédito pessoal com juros significativamente mais baixos do que aqueles cobrados nos empréstimos sem garantia. O aumento da participação do crédito consignado reduziu o risco e, por conseguinte, a taxa de inadimplência do crédito pessoal. Como pode ser visto no gráfico 5, apesar das oscilações conjunturais, a inadimplência do crédito pessoal apresenta uma tendência de queda nos últimos anos.

Note-se que, desde o início de 2011, o movimento geral de alta da inadimplência tem sido liderado pelo crédito para a aquisição de veículos. Nessa categoria ocorreram mudanças comportamentais importantes tanto na demanda por crédito, devido aos crescimentos da renda e do grau de formalização do trabalho, como na sua oferta, impulsionadas pelas alterações de legislação já mencionadas.

O estudo de Assunção, Benmelech e Silva (2012) [3]utiliza um modelo econométrico estimado a partir de microdados fornecidos por um dos maiores bancos privados do Brasil para analisar justamente os impactos que a reforma legal de 2004 teve sobre o crédito automotivo.

Os modelos estimados no referido estudo sugerem que as mudanças legais de 2004 resultaram em empréstimos maiores com spreads menores, prazos de vencimentos mais longos, maior exposição ao risco (por parte dos bancos) e, consequentemente, numa maior “democratização” do crédito – permitindo que tomadores com classificação mais arriscada e menores rendas obtivessem financiamentos associados à aquisição de carros mais novos e mais caros. Ou seja, verificou-se um processo de inclusão no mercado de uma parcela da população sem acesso ao crédito de automóveis.

O problema é que, juntamente com a ampliação desse acesso, cresceu também o número de tomadores sem conhecimento dos custos envolvidos na manutenção dos veículos (combustível, seguro, revisões etc.) e, portanto, de inadimplentes. Os bancos e montadoras, por sua vez, chegaram a oferecer financiamentos sem entrada, com prazos longos (acima de 60 meses) e até mesmo o chamado “troco na troca”, onde o financiamento era maior que o valor do carro dado como parte do pagamento.

Antecipando possíveis problemas com financiamentos deste tipo, o BCB incluiu entre as medidas macroprudenciais adotadas em dezembro de 2010 restrições de prazo (máximo de 60 meses) e percentual mínimo de valor de entrada (de acordo com o prazo de financiamento).

Cumpre destacar aqui, no entanto, que as dificuldades envolvidas no financiamento para compra de veículos não têm alcance sistêmico ou estrutural. Desde o segundo semestre do ano passado, os bancos passaram a ser mais criteriosos nas suas concessões de crédito, já restringidas, por outro lado, no âmbito das medidas macroprudenciais. De acordo com o Relatório de Estabilidade Financeira (REF) do BCB de setembro de 2011 (p. 18), “as medidas macroprudenciais implementadas desde dezembro de 2010 foram eficazes ao corrigir a velocidade de crescimento do crédito, evitar o alongamento excessivo dos prazos e, no caso específico do financiamento de veículos, melhorar o loan-to-value (LTV)”[4].

Portanto, o movimento da inadimplência nesse tipo de empréstimo aponta para uma tendência de redução gradual.

Gráfico - Saldo das operações de crédito do sistema financeiro para pessoas físicas
Gráfico 6
No segmento do crédito imobiliário, por sua vez, as reformas institucionais tiveram maior amplitude com melhores resultados. A expansão do crédito habitacional ocorreu a um ritmo mais intenso que o do crédito para a aquisição de veículos (tornando seu saldo superior em termos absolutos), ao mesmo tempo em que a taxa de inadimplência no segmento apresentou quedas significativas ao longo de todo o período pósreformas (gráficos 6, 7 e 8).

Gráfico -  Participação percentual de categorias selecionadas no saldo das operações de crédito
Gráfico 7

Gráfico - Situação dos contratos de financiamento habitacional do Sistema Brasileiro de Crédito
Gráfico 8
O elevado déficit habitacional ainda presente no Brasil faz com que a demanda por crédito imobiliário seja, também, ainda muito grande. Por outro lado, a compra do imóvel costuma ser uma decisão mais bem planejada pelas famílias do que a envolvida na aquisição de um automóvel.

Os bancos no Brasil também são mais cuidadosos ao analisar propostas de financiamento imobiliário. Enquanto o processo de análise para a liberação do financiamento de um veículo demora, em geral, um ou dois dias, o crédito habitacional é usualmente concedido somente depois de uma lenta e criteriosa avaliação, com duração de semanas e o envolvimento de diversas etapas (avaliação do imóvel por um perito, levantamento de informações sobre o dono do imóvel etc.).

Outra diferença importante entre os dois segmentos, e que ajuda a explicar a diferença de comportamento entre as respectivas taxas de inadimplência no período pós-reformas, é o fato de a casa própria constituir um bem essencial do ponto de vista das famílias, enquanto o automóvel é encarado, muitas vezes, apenas como um item de conforto. Quando há uma redução de renda e/ou gastos inesperados no setor das famílias, a tendência é priorizar o pagamento de despesas essenciais em detrimento de itens de conforto. Com a simplificação do processo de retomada do bem dado como garantia, o pagamento em dia da prestação da casa própria tornou-se ainda mais importante.

Outro motivo para uma redução tão expressiva da inadimplência dos financiamentos habitacionais é o efeito composição. Com o crescimento acelerado desse segmento de crédito, houve uma rápida redução da participação dos contratos firmados no período de inflação alta, que têm taxas de inadimplência superiores a 50%.

Uma variável que tem efeitos importantes sobre as taxas de inadimplência dos diferentes segmentos de crédito é a taxa de desemprego, que conta com um cenário positivo para este ano. Em que pese o efeito da crise internacional em alguns setores da economia brasileira, o mercado de trabalho vem mostrando um comportamento bem favorável, ao longo dos últimos anos. Para os próximos meses, a tendência é de manutenção deste cenário positivo para o emprego, possibilitado, sobretudo, pela melhora no desempenho da atividade econômica no país ao longo do segundo semestre deste ano. Desta forma, a taxa de desocupação deve permanecer em níveis historicamente baixos.

No que diz respeito aos rendimentos reais, a expectativa é de uma desaceleração nas taxas de crescimento, uma vez que a maior parte do impacto dos reajustes do salário mínimo já foi dissipada. Entretanto a trajetória ascendente dos salários deve continuar.

Outra variável que indica uma tendência de queda da taxa de inadimplência é o indicador de perspectiva de inadimplência do consumidor da Serasa Experian. Como mostra o gráfico 9, esse indicador está em queda, abaixo do nível 100 (nível de equilíbrio de longo prazo), e mostra um comportamento bem próximo ao da taxa de inadimplência do BCB (constituindo um bom indicador de antecedente desta última).

Gráfico - Taxa de inadimplência das pessoas físicas do BCB versus indicador de perspectiva de inadimplência do Serasa
Gráfico 9
Em síntese, a situação atual do mercado de crédito no Brasil é bem diferente da observada nos países, como os Estados Unidos, em que houve crise do sistema financeiro. O volume de crédito ainda é relativamente baixo e de curto prazo. Com a tendência de continuação do cenário positivo no mercado de trabalho e a redução da taxa de juros, o indicador de comprometimento da renda com o serviço da dívida e a taxa de inadimplência devem apresentar trajetórias descendentes. Nesse sentido, ainda, outras diferenças positivas marcantes no caso brasileiro são a solidez do sistema financeiro, o maior cuidado dos bancos na concessão de crédito e o menor grau de alavancagem das famílias.


1. Os dados de crédito imobiliário do Brasil foram calculados com base nas informações do Banco Central do Brasil (BCB) – crédito livre e direcionado. Os dados dos
Estados Unidos e da África do Sul são de 2011 e foram obtidos no site da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
2. “O SCR é um instrumento de registro e consulta de informações sobre as operações de crédito, avais e fianças prestados e limites de crédito concedidos por instituições financeiras
a pessoas físicas e jurídicas no país” (Banco Central do Brasil. SCR, 2004, documento disponível em:<http://www.bcb.gov.br/fis/crc/ftp/SCR_VisaoGeral_v1.00.pdf>).

3. Assunção, J. J.; Benmelech, E.; Silva, F. S. S. Repossession and democratization of credit. Cambridge, MA: National Bureau of Economic Research, 2012, 35 p.
(Working Paper, no 17.858).
4. Loan-to-value é a razão entre o valor do financiamento contratado e o valor do bem dado como garantia.

sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Marcelo Neri: até 2014 mais 12 milhões de pessoas ascenderão para a classe C

Matéria do Exame.com.

Apesar da desaceleração da economia, pesquisador da FGV Marcelo Neri reafirma projeção de que a classe C terá mais 12 milhões de pessoas até 2014
Keila Cândido

São Paulo - A expansão da classe média brasileira segue robusta, conforme dados apurados até junho, afirma o economista e coordenador do Centro Políticas Sociais (CPS) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Marcelo Neri. Em debate na 22ª Bienal do Livro, em São Paulo, ele reafirmou a projeção de que mais 12 milhões de pessoas ascenderão para esse segmento até 2014. Nas classes A e B, o número de entrantes chegará a 7,7 milhões. Neri não arrisca dizer, contudo, como será o comportamento dessas classes sociais de 2015 em diante. Entre 2003 e 2011, a nova classe média – que tem renda familiar de 1.700 reais – incorporou 40 milhões de pessoas.

Para Neri, foi a nova classe média que estabilizou a economia brasileira e fez crescer o Produto Interno Brunto (PIB) nos últimos anos em que tônica foi a crise internacional. “A classe média é o amortecedor interno da economia. Se ela quebrar, não sabemos para onde vai o país”, disse. O economista, autor do livro “A Nova Classe Média - O Lado Brilhante da Base da Pirâmide”, participou nesta quinta-feira de debate sobre o assunto.

Dos arquivos do blog:


2014 – Após a renda do brasileiro ter aumentado nos últimos anos, na esteira do crescimento econômico, o pesquisador não se arrisca a dizer como será sua evolução num intervalo de tempo mais extenso, a partir de 2014. “Estamos em um momento de pleno emprego, mas é arriscado dizer qual será a renda real das famílias da nova classe média”, disse.

Para Neri, por ora, não há sinal de que haverá reversão da ascensão social dos mais pobres. A classe média, aliás, ganhou força, segundo dados apurados até junho. De acordo com o economista, o mercado de trabalho faz mais diferença para o consumo destas pessoas do que o acesso crédito. “O que importa para elas é trabalhar e ter dinheiro no bolso para consumir”, explicou.

Novo consumidor – A nova classe média, hoje com maior poder de compra, tem tido acesso a bens e serviços que, anteriormente, eram restritos às classes A e B, tais como planos de saúde, escolas particulares e previdência privada. Neri lembrou que a má qualidade na oferta de serviços tem gerado nesse novo consumidor uma sensação de frustração. Na avaliação do especialista, é para essa insatisfação que as empresas têm de olhar. “Esta é a nova agenda no Brasil. As pessoas estão consumindo fortemente, e são exigentes”, afirmou.

Segundo Neri, os pacotes do governo para melhorar a infraestrutura do país – tal o programa de investimento de ferrovias e rodovias anunciado nesta quarta-feira – são de “extrema importância” porque esses novos consumidores aumentam os desafios do país. Em outras palavras, as pessoas estão consumindo o que antes não tinham acesso, como viajar de avião, por exemplo, o que tem aprofundado os gargalos dos aeroportos do país.

A alta da inadimplência verificada nos últimos meses não deve ser considerada o pior problema da classe C, na visão do economista. “O problema no Brasil não é de endividamento, mas sim as altas taxas de juros”, declarou. Outro problema, na opinião do pesquisador, é baixa taxa de poupança do brasileiro.

Comparações – Para o pesquisador, não é possível comparar a classe média americana à brasileira porque os perfis são muito diferentes. A renda das famílias e o tipo de consumo são bastante distintos. Neri relata que, desde 2004, quando houve o início da ascensão da classe média, o Brasil teve três saltos: mais pessoas tiveram acesso a cursos técnicos, houve aumento do número de pessoas com carteira assinada e a qualificação profissional também melhorou. Para o pesquisador, o acesso à educação é um avanço muito importante que contribui para a ascensão da classe C. "Quem olha para a classe média com olhar estrangeiro – de fora para dentro – não percebe o valor do que tem acontecido", disse. Essas particularidades representam outros elementos que não permitem equiparar a realidade brasileira com a americana.

O coordenador do CPS/FGV preferiu comparar o crescimento brasileiro ao de China e índia, que classificou como “invejáveis”. Contudo, na opinião do economista, no Brasil há um fator qualitativo: a redução da desigualdade. “No Brasil, o crescimento é mais sustentável porque temos a redução da desigualdade, que vem caindo nos últimos onze anos”, disse. “Este é o ingrediente brasileiro do crescimento”, comemorou.

quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Guardian: o boom econômico e as armas do Brasil e da América Latina pra enfrentar a crise europeia

Matéria do Guardian, mal traduzida por mim (com ajuda do Google, claro).

A foto é da publicação original e, apesar de não ter muita relação com o assunto, fica porque é de um desfile do Salgueiro.

Brasil e o resto da América Latina desfrutam boom econômico
Gastos, crescimento, dívida pública invejavelmente baixa  - é grande a diferença do velho mundo em crise.
Jonathan Watts, no Rio de Janeiro, Jonathan Franklin em Santiago e Sibila Brodzinsky em Bogotá

carro alegórico do king kong no desfile do Salgueiro no carnaval de 2011


Os caixas de dinheiro em Santiago estão ficando sem dinheiro, mas não é uma fuga dos bancos; os consumidores no Chile estão simplesmente gastando notas de Peso mais rápido do que os caixas automáticos podem fornecê-las. Novos arranha-céus estão surgindo em Bogotá para criar o espaço necessário para escritórios e para o varejo necessário numa economia em crescimento. O México – o novo queridinho dos investidores estrangeiros - está superando as previsões para o PIB. O Brasil, que ultrapassou o Reino Unido como sexta maior economia do mundo no ano passado, acaba de anunciar um plano de estímulo de US $ 66 bilhões (£ 42 bilhões), além do dinheiro que vai gastar na preparação para a Copa de 2014 e as Olimpíadas em 2016.


A América Latina está agora se reajustando, enquanto a maioria das nações espera um crescimento mais lento, porém ainda sólido, e algumas se preparam para mexer nas extensas reservas e gastar num caminho para fora da recessão global.

A sua capacidade de resistir à tempestade que se aproxima terá implicações de longo prazo para as percepções sobre uma região que, até recentemente, era sinônimo de turbulência financeira, gastos irresponsáveis ​​e políticas extravagantes. Recentemente, muitos governos da região têm sido elogiados pela ONU, FMI e Banco Mundial pela construção de fortes reservas e manutenção de níveis geralmente baixos de dívida pública.

Isto lhes dá mais espaço para abrir as torneiras do estímulo fiscal quando a economia começa a esmorecer, como o Brasil fez na quarta-feira com o anúncio de um pacote de estímulo de R$ 133 bilhões. Se eles puderem evitar os piores impactos da crise internacional sem afundar em dívidas - como a maioria das nações aqui fez em 2008 – isso reforçaria uma crescente reputação de gestão económica prudente.

Vários anos de forte crescimento nas economias mais fortes criaram uma dinâmica visível. Em Santiago, os crescentes preços da habitação, as centenas de novos restaurantes e as florestas de gruas no horizonte sugerem que a economia chilena tem costeado os estágios iniciais da última crise. As vendas de automóveis subiram tanto que, em um ponto do ano passado, o governo ficou sem placas de licença e foi forçado a emitir substitutas de papelão, enquanto apressadamente terminava a outra rodada de placas de metal.

Com um crescimento estimado do PIB este ano de 4,5%, além das robustas reservas do governo, o Chile está preparado para enfrentar possíveis conseqüências da Europa. "Nós temos uma posição bastante confortável para enfrentar os desafios em 2012," disse a direitora do orçamento, Rosanna Costa, a jornalistas em Santiago este ano. O governo dispõe de um fundo de estabilização estimado em US$ 14 bilhões, que pode ser usado para estimular a economia através de projectos de obras públicas ou infusões de dinheiro, conforme necessário.

O Peru também está aproveitando a expansão constante, enquanto a Venezuela, impulsionada pelas vendas de petróleo e uma farra de gastos pré-eleitorais de Hugo Chávez, espera um crescimento de mais de 5%, embora a sua capacidade de pagar as suas contas dependa dos preços elevados do petróleo.

Há algumas exceções significativas a essas tendências. A economia argentina deu uma parada na sequência da nacionalização dos ativos locais da YPF, empresa petrolífera espanhola, indicando a influência ainda forte dos mercados financeiros globais na América Latina.

Mesmo assim, a região deverá crescer entre 3 e 4% este ano – uma bonança em comparação com a depressão que aflige as nações latinas no velho mundo. Portugal, Espanha e Itália foram os países com pior desempenho, quando a UE anunciou esta semana que o PIB da zona do euro caiu 0,2% no último trimestre.

Os contrastes são gritantes. Enquanto a Espanha tem implorando por socorros, Juan Carlos Echeverry, o ministro das finanças de sua ex-colônia Colômbia, gabava-se de que este ano o seu governo "não precisa de mais receitas". Graças a taxas crescentes de investimento estrangeiro, desemprego em queda e crescimento anual de 4,5% por mais de uma década, as finanças de seu estado são consideradas em boa forma para suportar as consequências da Europa.

Embora o clima tenha escurecido nos últimos meses, novos símbolos de riqueza estão sendo construídas. A Colômbia está erguendo seu maior arranha-céu, o BD Bacatá, edifício de 66 andares que abrigará um shopping center, escritórios e até apartamentos de alto padrão.

O magnata imobiliário espanhol por trás do projeto, Venerando Lamelas, disse que ele está se movendo de acordo com o momento. "O mercado europeu não está bom. A América Latina é muito importante e dentro da América Latina o melhor mercado é a Colômbia", disse a um jornal local.

Outros estão seguindo as oportunidades atravéz do Atlântico. Gonzalo Rodriguez recentemente desistiu de seu emprego como um operador de títulos no mercado, na Espanha, e se mudou para o Brasil para trabalhar em uma empresa de energia, projetando linhas de transmissão de energia para parques eólicos.

"Eu não estou ganhando tanto aqui quanto na Espanha, mas estou pensando cinco anos à frente", disse em Copacabana o jovem de 25 anos. "Há 100% mais potencial de crescimento na energia no Brasil do que nos bancos espanhóis. Há muitas pessoas talentosas na Espanha sem encontrar emprego. Aqui, é o oposto. Eles não têm número suficiente de pessoas qualificadas."

Tal otimismo será testado nos próximos meses. O Brasil tem sido atingido mais do que qualquer outro país pela crise no exterior - em particular o enfraquecimento da demanda chinesa por commodities. É provável que ele cresça mais lentamente este ano (cerca de 2-3%) do que qualquer das outras grandes economias regionais, o que levou o presidente Dilma Rousseff a lançar o robusto pacote de estímulo de quarta-feira.

Ao contrário do passado, no entanto, ele tem o dinheiro para gastar. As reservas internacionais do Brasil cresceram de US$ 38 bilhões em 2002 para mais de US$ 370 bilhões, o que é um “caixa de guerra” substancial para afastar crise global.

"No passado ano, quando o mundo espirrava, pegamos pneumonia. Esse não é mais o caso", disse Rousseff neste ano. "Posso garantir a você, o Brasil é 100%, 200%, 300% pronto."

Muitos economistas questionam se o Brasil e a região como um todo vão se provar tão resistentes desta vez. A forte demanda da China por soja, cobre, petróleo e outras commodities ajudou a América Latina a costear a crise de 2008-09. Desta vez, com a desaceleração na China, terá de cavar mais fundo em suas reservas. Embora as finanças públicas estejam muito mais fortes do que eram nos anos 80 e 90, a grande questão é saber se ela investiu o bastante em capital humano.

"Trabalhos importantes aqui no Brasil estão sendo preenchidos pelos europeus, especialmente da Espanha e Portugal", disse Nelson de Sousa, professor de finanças na escola de gestão Ibmec. "Nós não colocamos o suficiente em educação e formação. Essa é a nossa grande dificuldade, que é muito diferente dos problemas enfrentados pela Europa.

"O governo brasileiro gasta muito, mas muito mal. Dilma está ciente disso, mas há uma grande diferença entre saber o que fazer e ser capaz de fazê-lo."

Se ela - e outros líderes da região – for bem-sucedida, no entanto, muito mais do que a tocha olímpica pode passando este ano da Europa para a América Latina.

sexta-feira, 10 de agosto de 2012

Ag. FAPESP: tecnologia brasileira, plástico biodegradável de açúcar está pronto para escala industrial; fala investidor.

Matéria da Agência FAPESP .

07/08/2012 - Por Karina Toledo

Agência FAPESP – Há mais de dez anos, a empresa PHB Industrial produz em escala piloto o Biocycle, um plástico biodegradável feito com açúcar de cana. Apesar de dominar a tecnologia para fabricar diversos produtos com o polímero e para tornar seu custo competitivo quando comparado ao do plástico convencional, a empresa ainda não conseguiu elevar sua produção a uma escala industrial.


Dos arquivos do blog:
Para Roberto Nonato, engenheiro de desenvolvimento da PHB Industrial, o caminho mais curto para levar o Biocycle ao mercado seria uma parceria com a indústria petroquímica. “Temos tentado isso há alguns anos, mas o pessoal do petróleo não costuma conversar com o pessoal do açúcar”, disse durante sua apresentação no workshop “Produção Sustentável de Biopolímeros e Outros Produtos de Base Biológica”, realizado na sede da FAPESP.

A história do Biocycle começou no início dos anos 1990, época em que a Cooperativa dos Produtores de Cana, Açúcar e Álcool do Estado de São Paulo (Copersucar) procurava outros produtos que pudessem ser fabricados em uma usina de açúcar que não fossem commodities.

Por meio de uma parceria com o Instituto de Pesquisas Tecnológicas (IPT) e com o Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da Universidade de São Paulo (USP), a Copersucar conseguiu produzir o polihidroxibutirato (PHB) – um polímero da família dos polihidroxialcanoatos (PHA) com características físicas e mecânicas semelhantes às de resinas sintéticas como o polipropileno – usando apenas açúcar fermentado por bactérias naturais do gênero alcalígeno.

Em 1994, uma planta piloto foi instalada na Usina da Pedra, em Ribeirão Preto. Em 2000, foi criada a PHB Industrial e a tecnologia passou a pertencer ao Grupo Pedra Agroindustrial, de Serrana, e ao Grupo Balbo, de Sertãozinho.

Com apoio da FAPESP por meio do Programa FAPESP Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (PIPE) e auxílio de pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos (UFScar), a empresa desenvolveu a tecnologia de produção dos pellets – pequenas pastilhas cilíndricas feitas com uma mistura de PHB e fibras naturais –, matéria-prima usada pela indústria transformadora para produzir utensílios de plástico.

“Inicialmente, nos preocupamos apenas em desenvolver o PHB e achávamos que a indústria transformadora faria o resto, mas, quando você chega com uma resina nova ao mercado, ninguém sabe como processar. Percebemos que era preciso ir além”, disse Nonato à Agência FAPESP.

A técnica de misturar PHB com fibras vegetais trouxe outra vantagem: a redução do custo. Enquanto o quilo do polipropileno custa em torno de US$ 2, o quilo do PHB sai por volta de US$ 5. “Se você mistura com pó de madeira, por exemplo, barateia o produto e dá a ele características especiais que podem ser interessantes”, explicou o engenheiro.

Diversas aplicações
O PHB é um material duro que pode ser usado na fabricação de peças injetadas e termoformadas, como tampas de frascos, canetas, brinquedos e potes de alimentos ou de cosméticos. Também pode ser aplicado na extrusão de chapas e de fibras para atender a indústria automobilística. Serve ainda para a produção de espumas que substituem o isopor.

“Desenvolvemos diversas aplicações para o polímero em cooperação com outras empresas. A indústria automobilística, por exemplo, nos procurou para testar o PHB e vimos que o polímero era viável na fabricação de peças para o interior dos carros. Mas, como ainda não temos condições de produzir em escala industrial, não conseguimos entrar no mercado”, disse Nonato.

Segundo Nonato, a empresa chegou a ter uma pequena produção industrial de painéis de trator. O produto era mais barato que o equivalente feito com plástico convencional e, ainda assim, o negócio não prosperou. “Era uma produção tão pequena para o padrão da indústria, acostumada a comprar centenas de toneladas, que acabaram desistindo por dificuldades operacionais”, disse.

Para ampliar a produção, a PHB Industrial teria de aumentar sua planta. Segundo Nonato, isso exigiria um investimento muito superior ao que uma usina de açúcar tem como meta. Seria preciso um parceiro.

Também precisaria de ajuda para dar suporte aos compradores. “É necessário ter uma equipe que vá a campo ensinar qual é a temperatura certa para processar o PHB, o tipo de forma, o tipo de rosca. O mercado é pulverizado e grande parte dele está na Europa. Somente as grandes petroquímicas teriam condições de dar esse suporte”, disse.

Enquanto no Brasil o mercado para o PHB é restrito a nichos interessados em fabricar produtos com apelo ecológico a um preço mais elevado, na Europa a busca por produtos biodegradáveis é grande, segundo Nonato. “Na Europa, a agricultura hidropônica é forte e a legislação ambiental é rígida. Usa-se muito material biodegradável em estufas”, contou.

Com o PHB, é possível fabricar braçadeiras para plantas ou tubetes para reflorestamento e depois encaminhar o resíduo plástico para estações de compostagem, onde ele é rapidamente absorvido pela natureza.

Enquanto os plásticos tradicionais levam mais de cem anos para se degradar, os produtos feitos com PHB se decompõem em torno de 12 meses e liberam apenas água e dióxido de carbono.

Além da agricultura, o material pode ser usado na fabricação de embalagens para alimentos, cosméticos e outros produtos oleosos que são de difícil reciclagem. “O mercado existe e nosso produto está pronto. O que falta é um canal para chegar ao mercado e um pouco mais de investimento”, disse.

quinta-feira, 9 de agosto de 2012

Exame: em sua política de cooperação "sul-sul", Brasil envia a Embrapa para tentar produzir comida na savana africana.

Matéria da Exame, para voltando ao assunto deste post: Do New York Times: os ganhos do Brasil em sua relação com a África.

Cooperação ''é hoje uma ferramenta importante para a política externa e para as relações internacionais'', informou Farani

Brasília - O Brasil destina cerca de US$ 1 bilhão anuais à cooperação do chamado ''eixo Sul-Sul'' e se propõe manter e até aumentar o investimento, disse nesta quinta-feira à Agência Efe o diretor da Agência Brasileira de Cooperação (ABC), o ministro Marco Farani.

Apesar do atual cenário de crise, ''a tendência é aumentar'' esses valores, pois a cooperação ''é hoje uma ferramenta importante para a política externa e para as relações internacionais'', informou Farani.

Segundo o diretor da ABC, embora esse US$ 1 bilhão anual seja um valor ''considerável'', só representa em torno de 0,02% do Produto Interno Bruto (PIB) do Brasil, um país que é hoje a sexta economia do mundo. ''Esse papel aumenta o sentimento de responsabilidade, é necessário ajudar ainda mais para criar um mundo melhor'', disse.

A maior parte dos projetos de cooperação desenvolvidos pelo Brasil se concentra na América Latina e na África, regiões que têm desafios sociais e econômicos semelhantes, e estão mobilizados a criar condições que permitam melhorar a vida das sociedades.

O diretor da ABC informou que 21,86% dos projetos que desenvolve com 31 países da América Latina e do Caribe e com outros 42 da África são ligados ao setor agrícola.

Nessa área, o Brasil se consolidou durante os últimos anos como uma ''potência mundial'' e desenvolve suas próprias tecnologias que, através da cooperação internacional, põe à disposição de outros países em desenvolvimento.

Farani explicou na entrevista à Efe que um dos principais projetos da ABC na atualidade é desenvolvido em Moçambique, com a participação do Japão, esperando tornar viável a atividade agrícola nas regiões de savanas.

A ideia se baseia em um modelo aplicado no cerrado brasileiro, que se estende pela região central e onde, graças à processos tecnológicos e apesar da pobreza da terra, hoje se cultiva de algodão até soja.

O diretor da ABC disse que se o projeto em Moçambique der certo, cerca de 14 mil hectares de savana poderiam ser aproveitados e o país passaria a ser um grande produtor de alimentos.

A experiência poderia então ser aplicada em outros países da África, um continente com cerca de 400 mil hectares de savanas ociosas que poderiam ser utilizados para agricultura.

A incentivadora dessa cooperação agrícola entre a África e a América Latina é a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), uma instituição pública voltada para a pesquisa e a biotecnologia, que ajudou a fazer do Brasil um dos maiores produtores mundiais de alimentos.

''É uma instituição forte, que desenvolve tecnologias e processos próprios para as regiões tropicais'', que são facilmente adaptáveis aos países da América Latina e da África, disse Farani.

Na mesma descrição situou também a Fundação Oswaldo Cruz, órgão público dedicado à pesquisa em saúde, uma área que representa 16,28% dos projetos de cooperação internacional promovidos pelo Brasil.

A preocupação da ABC com a vertente social e econômica da parceria, segundo explicou Farani, nasce da própria experiência brasileira que, na última década, permitiu o país tirar da pobreza cerca de 30 milhões de pessoas.

''O Brasil agora pode oferecer solução para os problemas que está resolvendo e pode fazer isso com uma base comprovada de sua própria experiência, por isso a cooperação acontece em um plano de maior igualdade e entre países que compartilham os mesmos desafios para alcançar o desenvolvimento pleno'', declarou.

Não se assuste, pessoa!

Não consegui escolher. Guardo as duas.






quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Do New York Times: os ganhos do Brasil em sua relação com a África

Artigo publicado no New York Times.

O Brasil ganha negócios e influência com suas ofertas de ajuda e empréstimos à África

RIO DE JANEIRO - Em Moçambique, o governo brasileiro está abrindo uma fábrica de  medicamentos anti-retrovirais para combater a epidemia de Aids. O Brasil está emprestando $ 150 milhões para o Quénia construir estradas e diminuir o congestionamento na capital, Nairobi. E, em Angola, a potência petrolífera da África Ocidental, um novo acordo na área de segurança visa expandir a formação de pessoal militar angolano no Brasil.

O Brasil, que tem mais pessoas de ascendência Africana que qualquer outro país fora da própria África, está assertivamente elevando o seu perfil no continente, baseado nos laços históricos do tempo do Império Português.


O conjunto de projetos de ajuda e de empréstimos recentemente oferecidos aos países africanos apontam para as ambições do Brasil tanto de projetar uma maior influência no mundo em desenvolvimento e quanto de expandir seus negócios na África, onde algumas economias estão crescendo rapidamente, apesar de partes do continente ainda lidar com guerras e fome. A ofensiva de charme está se pagando nos no aumento nos fluxos de comércio entre o Brasil ea África, que cresceram de US $ 4,3 bilhões, em 2002, para 27,6 bilhões dólares em 2011.

"Há o sentimento crescente de que a África é fronteira do Brasil", disse Jerry Dávila, um historiador da Universidade de Illinois, que escreveu extensivamente sobre avanços do Brasil em todo o Oceano Atlântico Sul. "O Brasil está na posição privilegiada de finalmente alcançar a capacidade institucional para fazer isso".

As incursões do Brasil na África são semelhantes às ambições de outras potências emergentes, como Turquia, que estabeleceu a sua influência no mundo árabe, e promoção, pela Índia, de sua cultura em toda a Ásia.

O destaque dado à África também reflete a mudança do Brasil, de beneficiário de auxílio para provedor. Grandes desafios de desenvolvimento persistem no Brasil, incluindo as lamentáveis ​​escolas públicas e uma forte desaceleração econômica este ano. Mas o Brasil é um grande exportador agrícola, que recentemente ultrapassou a Grã-Bretanha como a sexta maior economia mundial e que, agora, possui mais embaixadas na África do que a Grã-Bretanha - uma notável mudança de quando, na década de 1960, o Brasil dependia da ajuda externa, em grande parte dos Estados Unidos, para aliviar a fome no nordeste pobre do país.

A África agora representa cerca de 55% dos desembolsos pela Agência Brasileira de Cooperação, que supervisiona os projetos de ajuda no exterior, de acordo com Marco Farani, seu diretor. Ao todo, incluindo os intercâmbios educacionais e uma carteira de crédito em expansão, a ajuda externa do Brasil ultrapassa US $ 1 bilhão, disse ele. Grandes porções da ajuda brasileira também vão para países da América Latina, e há um pequeno foco em Timor Leste, antiga colônia Português no Sudeste Asiático.

"Nós ainda temos uma presença menor de ajuda externa do que alguns outros países, mas estamos aprendendo como fazer a cooperação", disse Farani.

O Brasil ainda está atrás de outras nações, nomeadamente a China e os Estados Unidos, que têm programas de ajuda e comércio muito mais expansivos na África. Na América Latina, Venezuela e Cuba têm oferecido diferentes formas de melhorar os laços africanos. A Venezuela organizou uma reunião de cúpula em 2009, entre líderes africanos e sul-americanos, em que o presidente Hugo Chávez estreitou uma aliança com o líder da Líbia, na época, coronel Muammar el-Kadafi.

Durante a guerra fria, tropas cubanas apoiaram governos comunistas na África. Em Angola, esta missão incluiu a tarefa aparentemente paradoxal de proteger um complexo petrolífero da Chevron, ao mesmo tempo que os Estados Unidos apoiavam uma insurgência contra os líderes locais. Mais recentemente, Cuba enviou milhares de médicos para a África.

Mas, enquanto os esforços de Cuba e da Venezuela priorizaram amplamente  a solidariedade do mundo em desenvolvimento com algumas nações africanas, a crescente operação do Brasil na África é mais complexa, envolvendo ambições de fazer do Brasil uma potência diplomática e econômica.

Após uma onda de abertura de missões diplomáticas na última década, o Brasil agora tem 36 embaixadas em África, e espera abrir a sua 37ª no Malawi este ano. O Brasil já está usando esta presença para reforçar suas ações no cenário mundial, enviando jatos para trazer delegações de Serra Leoa, Libéria e Cabo Verde para a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, que foi realizada aqui em junho.
Outros projetos são destinados a atrair africanos para estudar no Brasil. Anos apssado, uma nova universidade começou a oferecer aulas a estudantes de  países de Língua Português, incluindo Angola, Guiné-Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe.

Como o Brasil não precisa importar grandes quantidades de petróleo ou de alimentos, os seus planos em África diferem um pouco de outros países em busca de maior influência lá. Os projetos se ligam em grande parte com esforços para aumentar as oportunidades para empresas brasileiras, que às vezes trabalham com o governo do Brasil na oferta de ajuda.

Alguns dos maiores avanços do Brasil, previsivelmente, estão em  países de Língua Português, como Angola, onde a empreitera brasileiras Odebrecht está entre os maiores empregadores, e Moçambique, onde a mineradora Vale iniciou um projeto gigante (de U$6 bilhões) de expansão do carvão.

Mas as empresas brasileiras também estão sondando por oportunidades em outras partes da África, fincando estacas na Guiné e Nigéria. Um banco de investimento líder no Brasil, o BTG Pactual, iniciou em maio um fundo de 1 bilhão dólares, focado em investir em África. Novos vínculos também estão surgindo, incluindo empreendimentos agrícolas brasileiros no Sudão; um vôo a partir de Adis Abeba, capital da Etiópia, para São Paulo; e um cabo de fibra óptica ligando o Nordeste do Brasil à África Ocidental.

Algumas incursões do Brasil na África trouxeram complicações, incluindo críticas quanto o estreitamento de laços com líderes ligados a abusos dos direitos humanos, como presidente da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang Nguema Mbasogo. Uma medida de liberdade de informação permitiu que jornalistas se aprofundassem em negócios africanos de armas de empresas brasileiras, incluindo a venda de bombas de fragmentação para o Zimbabwe.

Estudantes africanos que estudam no Brasil apresentaram inúmeras denúncias descrevendo insultos e agressões, o que complica o mito de "democracia racial" que já prevaleceu aqui, quando estudiosos afirmavam que o Brasil tinha escapado à discriminação, comum em outras sociedades.

Em um episódio, aqui no Rio, Eleutério Nhantumbo, um oficial de polícia moçambicano, com uma bolsa para estudar segurança pública em uma universidade brasileira, disse que, em uma ocasião, ele foi parado por policiais, que, sob a suspeita de que ele havia roubado algo, mandaram ele para levantar sua camisa ao sair de uma loja. Ele disse que, quando questionou por que o haviam escolhido, os policiais responderam com uma ofensa racial e o advertiram a não falar com eles sem respeito. Ao ouvir seu sotaque Português, eles lhe perguntaram sobre suas origens. "A polícia perguntou: 'Onde pe Moçambique?'", disse Nhantumbo,. "Eles não sabiam que existia um país com esse nome."

O Brasil, durante século intimamente ligado à África por rotas de navegação e pelo comércio de escravos, pensa-se, importou 10 vezes mais escravos que os Estados Unidos, antes da escravidão ser abolida aqui, em 1888. Por um momentono século XIX, o Brasil foi a sede do Império Português, o que tornou sua capital, então o Rio de Janeiro, um centro nervoso do comércio com a África.

Esses laços murcharam até que os líderes civis procuraram estabelecer relações com os governos recém-independentes em África, nos anos 1960. Esse processo esfriou depois que governantes militares tomaram o poder no Brasil, num golpe apoiado pelos Estados Unidos em 1964.

Em seguida, na década de 70, necessidades econômicas e uma busca de construir uma autonomia dos Estados Unidos estabeleceram as bases para o fortalecimento diplomático na África de hoje. Buscando compensar os gastos com importações de petróleo, que incluiam cargas provenientes da Nigéria, os governantes militares buscaram abrir novos mercados na África para as empresas brasileiras. Eles encontraram algum sucesso, nomeadamente na Angola recém-independente.

O ex-presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, trabalhou sobre essas incursões em viagens à África de 2003 a 2010, referindo-se à "dívida histórica" ​​que o Brasil tem com a África em sua formação como nação.

Taylor Barnes contribuiu com reportagem.