Isto não é um artigo; isto não tem qualquer relevância. É um questionamento pessoal, um desabafo, um descarrego, uma descarga. E, como tal, terá, é provável, o conteúdo e forma do que normalmente vai nelas. Será publicado sem revisão ou releitura.
A gente, quase todo mundo, se impressiona com o caldo de ódio em que nos metemos. A gente, quase todo mundo, se assusta com ele. A gente, quase todo mundo, o critica. A gente, quase todo mundo, vai sendo arrastado para ele sem perceber. A gente faz parte: de dentro; de fora calando; de fora sendo arrastado; de fora criticando, talvez também.
Aliás, de fora criticando, a gente pode também acabar inviabilizando o debate. De fora criticando, a gente pode acabar louvando a imparcialidade inoportuna, a isenção e o cinismo.
Mas isso não vem ao caso.
O “caso” é até que ponto podemos ir na tomada de posição, na crítica, sem caminhar para o ódio. O “caso”, na verdade, é até onde eu quero ir na tomada de posição? Toda crítica contundente é expressão de ódio?
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Durante muito tempo, meu irrelevante perfilzinho fake no Twitter tentou manter certa moderação. Que eu me lembre, nunca xinguei ninguém, por mais ácido que tenha sido. Que eu me lembre, nunca participei de linchamentos, ao menos não intencionalmente e com agressões baixas.
Sempre tentei não entrar nessa, pois: (a) não gosto; c) nunca achei produtivo; e (c) achava injusto fazê-lo sem dar a cara a tapa, usando um fake (ou pseudônimo, já que nunca fingi ser outra pessoa ou usei qualquer estratégia pra me esconder).
Mas isso também não vem ao caso. Ou melhor, isto aqui tá ficando com cara de autodefesa – não era a ideia.
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Ontem, uma das pessoas mais gentis e corretas (intelectualmente honestas) que o Twitter me deu o prazer de seguir parece ter sido alvo das matilhas que caçam por lá. E, claro, sofreu imerecidamente (existe sofrimento merecido?).
E é aí que, mesmo sem ter participado, entro eu e este descarrego.
Não, eu não concordo com todas as conclusões a que ela chegou. Não sei se todas as críticas pesadas são linchamento; não sei se todos que as fazem são mesmo parte de matilhas; não sei se a intenção sempre é mesmo destruir e calar o criticado; e não sei se o perfil do criticado não tem que entrar no juízo sobre o crítico (crítico, não o pura e simplesmente agressor).
Mas sei que há certa razão na indignação.
E tenho que pensar sobre o que posso mudar: eu.
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Há uns meses, fixei um tuite no perfil mais ou menos assim: moderação; tinha, mas acabou.
Foi ali pela mesma época em que, diante da nossa situação, achei que o momento impunha o suicídio do pseudônimo. Cara e nome real foram para o perfil.
Ele, é claro, manteria a mesma razão de ser: o espernear, os desabafos irrelevantes de quem não é ninguém na fila do pão. Mas, em momento tão crítico, os desabafos tendiam mesmo a perder qualquer moderação – ou deixariam de serem desabafos.
E usar a própria cara e o próprio nome me liberou para “confrontar” (com aspas, pois minha adorada irrelevância inviabiliza elevar meus chistes à confrontação) diretamente alguns formadores de opinião, em sentido amplíssimo.
Que me lembre, por mais ácido que tenha sido, nunca xinguei ninguém. E só confrontei pessoas cujas posições, me parece, lhes conferem certa responsabilidade social, pessoas com lugar na fila do pão (função + visibilidade + uso dessa conjunção de fatores).
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Não posso fingir que não vi acontecer. Mas parece que, pela soma destas desculpas autocomplacentes (?), talvez não tenha enxergado.
Não xinguei. Ok.
Sou irrelevante. Ok.
Os alvos eram atores socialmente responsáveis. Ok.
Mas e daí?
Mesmo sem intenção de atrair matilhas, mesmo que as minhas confrontaçõeszinhas não pretendam conscientemente calar ninguém, mesmo que sejam só o espernear possível para um "fora da fila de pão", a verdade é que elas não levam a lugar nenhum.
Ou melhor, talvez sim. Talvez (certamente?) me levem em direção ao ódio. Talvez (certamente?) sejam mais um pinguinho no caldo de ódio, que ameaça nos escaldar a todos.
Provavelmente, é uma ideia boba. Mas tenho a impressão que estas coisas meio amorfas, os sentimentos pessoais e sociais, se acumulam. Quanto mais cada um afirma a própria raiva, ela vai acumulando em si - e nos grupos, na sociedade. Ela vai acumulando e levando cada um, e a sociedade, a este transbordar de ódio.
E, claro, nada de bom pode vir daí. A raiva e o ódio não nos ensina nada – pessoalmente ou socialmente.
Acho.
E não quero. Não quero.
Ainda vou pensar melhor sobre a legitimidade do uso das redes sócias pelos “sem voz” para a confrontação dos atores socialmente responsáveis em função do poder de suas vozes.
Provavelmente, nunca acharei isso realmente errado – dentro de alguns padrões, que não incluem agressões e linchamentos organizados.
Mas não. Não quero.
Não vou criticar a utilização moderada das redes sociais pra falar com os atores sociais “relevantes”, para confrontá-los.
Mas não. Não quero. Não está sendo bom.
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Os fatos de ontem me ajudaram a acordar para o cheiro ruim que vinha sentindo.
Estava tão próximo, que não poderia mesmo vir só dos outros.
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Enfim, vou tirar aquele alerta fixado no meu perfil.
E procurar um novo lugar na escala de moderação.
Vou tentar achar um lugar que não transforme minha permanência no Twitter em acumulação improdutiva de raiva.
Este lugar vai continuar crítico – ou o perfil não teria razão pra existir.
Este lugar vai continuar tendo os desabafos – ou o perfil não teria razão pra existir.
Mas, principalmente, este lugar vai tentar não confrontar @s pessoais, mesmo de atores socialmente responsáveis. Não acho que seja relevante pra isso, mas não quero provocar matilhas. Diante do quadro, não acho que adiante, mas não quero fomentar (e fermentar) minha raiva.
Este lugar vai, enfim, tentar não participar do enchimento do caldeirão de ódio. Seja lá o que isso signifique.
Quem sabe se, sem pessoalizar a indignação, ela se torne algo mais produtivo que raivinhas – e ódio.
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In dubio, mea culpa. (Esse latim deve estar errado, mas a piadinha vai ficar aí.
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