O avanço de P&D no Brasil.
Artigo de Cristiano Romero
Governo e indústria investem mais no setor, que ainda precisa absorver doutores e pesquisadores no setor privado
Nunca foi fácil convencer empresário brasileiro a destinar parte do capital de suas companhias a investimentos em pesquisa e desenvolvimento (P&D). O ambiente macroeconômico, marcado por décadas de inflação crônica, não ajudava, mas, além disso, inexistia no país uma cultura pró-Ciência e Tecnologia (C&T). Felizmente, isso está mudando.
Em 2006, o Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT) lançou, por meio da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), o primeiro edital para a concessão de subvenção econômica (recursos a fundo perdido) a empresas interessadas em investir em inovação. De lá para cá, a demanda tem sido crescente. No total, chegou a 8.890 projetos, dos quais, 791 foram aprovados, a um custo de R$ 1,5 bilhão para os cofres públicos. Neste ano, serão liberados mais R$ 600 milhões para essa modalidade.
Além da subvenção, têm crescido, também de forma exponencial, as operações de crédito, igualmente para projetos de inovação, realizadas pela Finep e o BNDES. No primeiro caso, os desembolsos saltaram de R$ 117 milhões em 2004 para R$ 1,6 bilhão no ano passado. No BNDES, as liberações para projetos de apoio à inovação saltaram de R$ 105 milhões em 2006 para R$ 1,3 bilhão em 2008 - até outubro de 2009, os empréstimos haviam atingido R$ 980 milhões. Na gestão do presidente Luciano Coutinho, o banco passou a considerar inovação tecnológica um dos critérios da análise dos pedidos de crédito.
Nos dois casos, é interessante notar que a concessão de crédito cresceu em meio à crise financeira internacional. Esta é, sem dúvida, uma novidade. No passado, toda vez que o Brasil entrava em crise, ou por suas próprias mazelas ou em decorrência de turbulência externa, o governo cortava, imediatamente, a liberação de recursos para investimentos em C&T.
O governo federal, que tem tido um papel importante na alavancagem das aplicações privadas em P&D, não se deixou abater pela crise. Os dados de execução orçamentária do MCT mostram que, em 11 anos, os recursos para C&T, excluídos os gastos com pessoal, cresceram 506%. Em 2009, atingiram R$ 5,6 bilhões e no ano corrente devem chegar a R$ 7,2 bilhões, um recorde.
O Brasil está começando, finalmente, a entrar na corrida das nações nessa área. A combinação de investimento público e privado tem elevado de forma expressiva o dispêndio nacional em P&D. Em 2004, ano que marcou o fundo do poço em C&T no período recente, possivelmente em consequência da violenta crise fiscal vivida pelo Estado brasileiro em 2002 e 2003, o total aplicado foi de apenas 0,9% do PIB. Em 2008, pulou para 1,13%.
Os números mostram que o Brasil ainda está aquém da média dos países da OCDE - de 2% do PIB. Por outro lado, revelam que tem ocorrido uma evolução firme no país. "O Brasil é uma economia de pesquisa competitiva e crescentemente importante. A capacidade de sua força de trabalho de pesquisadores e o investimento em P&D estão expandindo rapidamente, oferecendo muitas novas possibilidades num portfólio de pesquisa diversificado", atestou, em relatório do ano passado, a Thomson Reuters, empresa que lidera o fornecimento de informações sobre publicações de pesquisa e suas citações no mundo.
O ministro da Ciência e Tecnologia, Sergio Rezende, acredita que a mudança de mentalidade em curso no país se deve, em primeiro lugar, à mudança do ambiente econômico, que passou a exigir das empresas maior produtividade e competitividade.
No setor público, um marco importante foi a criação, no governo Fernando Henrique, dos fundos setoriais de C&T, uma fonte permanente de recursos para pesquisa, e, já no governo Lula, a aprovação da Lei de Inovação, que tenta aproximar a pesquisa científica dos empreendimentos privados, além da chamada Lei do Bem, que criou incentivos fiscais para as empresas interessadas em aplicar em P&D.
Físico, com doutorado no MIT (Massachusetts Institute of Technology), a meca da inovação científica nos Estados Unidos, Rezende chama a atenção para o fato de entidades empresariais brasileira, como a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e o Movimento Brasil Competitivo (MBC), criado pelo empresário Jorge Gerdau, terem acordado para a importância dos investimentos em P&D. Ele lembra que, hoje, o Brasil forma 10 mil doutores por ano e publica cerca de 20 mil papers científicos, dez vezes mais do que fazia em 1981.
Apesar da sensível melhora, muito ainda há para se avançar. Existem programas do MCT em que sobram recursos e falta demanda. Um deles é a subvenção paga pela Finep às empresas que contratem mestres ou doutores para trabalhar em projetos inovadores - o benefício lhes assegura o pagamento de 50% do salário do novo funcionário.
Desde o lançamento do incentivo, há quase quatro anos, apenas 42 mestres e 26 doutores, de 18 empresas, foram empregados no âmbito do programa. "As empresas preferem contratar engenheiros. Apesar do benefício, acham caro contratar mestres e doutores", diz Rezende.
(Valor Econômico, 3/2)
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