quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Nassif: na verdade, Governo Federal impediu que cliente de Dirceu lucrasse com a rede da Eletronet.

24/02/2010 - 08:19
Veja em que lamaçal se meteu a Folha.
Aqui, um resumo. Na sequência, a descrição. Clicando aqui, o clipping das matérias do dia sobre o tema.
1. Ontem matéria do notório Márcio Aith denunciou que a decisão do governo de recuperar a rede de fibras óticas da Eletronet – massa falida administrada pela Justiça do Rio – permitiria a Nelson Santos, ex-acionista, receber R$ 200 milhões. E relacionava essa operação com a consultoria que lhe foi prestada por José Dirceu.
2. Os fatos foram amplamente desmentidos no decorrer do dia. Mostrou-se que seria impossível qualquer pagamento a Nelson, já que o governo retomou a rede de fibras óticas da empresa e as pendências remanescentes são com os credores, não com os ex-acionistas.
Hoje, o notório Aith volta ao tema, não toca mais no assunto Nelson Santos. Substituiu o escândalo anterior por um novo: a operação, na verdade, destinava-se a permitir a Oi, em conluio com o governo, assumir a rede da Eletronet.
É outro factóide desmentido pelos fatos: o governo quer que a Telebras se incumba da rede de banda larga, contrariando os interesses das operadoras. Quais os dados objetivos que fundamentam a acusação de Aith? Nenhum. Ou melhor, uma tentativa da Oi de negociar com os credores da Eletronet. E que não deu certo, porque, segundo a OI, chegou-se a um «impasse comercial».

3. Aí a reportagem do Estadão driblou o controle do aquário e mostrou a razão do impasse comercial: a tentativa da OI foi vetada pela Eletrobras, controlada pelo governo. Com isso, impediu-se a OI de assumir a empresa e o Nelson de embolsar R$ 70 milhões.
Os fatos e as notícias
Vamos aos detalhes dessa mixórdia jornalística.
Ontem a Folha publicou a suposta denúncia de que, ao ressuscitar a banda larga e aproveitar a rede da massa falida da Eletronet, o governo poderia pagar R$ 200 milhões a Nelson dos Santos – que recebeu 51% da Eletronet de antiga controlodora, a AES, por R$ 1,00. Para reforçar a denúncia foi informado que Nelson tinha contrato de R$ 20 mil por mês com José Dirceu.
No decorrer do dia, mostrou-se que a denúncia era vazia, a partir das seguintes informações:
1. O governo pretende utilizar a rede de fibras óticas da Eletronet para montar sua rede de banda larga, não a Eletronet
2. Para tanto, quando a Eletronet foi à falência, pegou de volta a rede de fibras óticas, sem pagar um tostão.
3. A empresa tornou-se uma massa falida gerida pelo Poder Judiciário do Rio, que tem a posse legal das fibras óticas. E segurou-as para garantir os direitos dos credores de receber a dívida.
Portanto, a única pendência é a Jurídica, envolvendo a União (que quer as fibras), os credores (que querem receber parte do devido) e a Justiça carioca, que administra a massa falida. Não há a mais remota ligação de Nelson dos Santos com o caso. Nelson recebeu a empresa por R$ 1,00, a empresa faliu, ele sai sem nada.
Se o repórter Márcio Aith garantia que, mesmo assim, Nelson poderia receber R$ 200 milhões do governo, de que forma se daria isso, porque se pagaria, se o assunto está sendo resolvido na Justiça, não no Executivo?
Hoje o Aith volta ao tema. O que ele levanta:
Passo 1 – reformula a “denúncia”, já que a anterior foi desmontada no próprio dia. Agora, a denúncia diz que a Oi negocia a compra da dívida da Eletronet com seus credores por cerca de R$ 140 milhões, quase 20% do valor total, estimado em R$ 800 milhões.
O objetivo seria retirá-la da falência e, como contrapartida, explorar comercialmente a rede da companhia.
Caso seja concretizado, será outro negócio controverso da Oi envolvendo o governo. Em 2005, a operadora investiu R$ 5 milhões na Gamecorp, empresa que tem como sócio Fábio Luis Lula da Silva, filho do presidente. Três anos depois, o governo aprovou a mudança na legislação do setor de telecomunicações para que a Oi comprasse a Brasil Telecom. Desse negócio surgiu a atual Oi, dona de uma rede comparável à da Embratel e à da Eletronet em cobertura nacional.

O governo já anunciou taxativamente que transferirá a rede «acesa» para a Telebras operar, ela própria, a banda larga nacional. São compromissos públicos, anunciados pelo Lula. Assim como a intenção de nada pagar pela rede da Eletronet.
Aí o notório Márcio Aith pega uma intenção da OI – de negociar com os credores na Justiça, isto é, sem passar pelo campo do Executivo – e transforma em «outro negócios controverso», comparando com o da BrOi – esse, efetivamente, controverso.
Para dar aparência de seriedade a essas suposições, o repórter vai ouvir a Oi, e recebe a seguinte informação:

A Oi não quis comentar o caso. Disse somente que “estudou o negócio, sua pertinência e compatibilidade, mas chegou a um impasse comercial”.
E quanto aos R$ 200 milhões que seriam pagos ao Nelson dos Santos? Nenhuma informação, nenhuma para o ponto central da manchete escandalosa de ontem. Simplesmente esquece que, ontem, o “escândalo” era o suposto pagamento de R$ 200 milhões ao Nelson.
Limita-se a escrever o seguinte:

O governo tenta solucionar a dívida da Eletronet desde 2003, quando a companhia pediu autofalência. Embora o governo diga, por meio da AGU (Advocacia-Geral da União), que as fibras ópticas foram transferidas à União por liminar, os credores continuam recorrendo na Justiça.

Observação: os credores, não o Nelson. Vamos até o fim para saber onde aparece o Nelson:
Eles alegam que as fibras são de sua propriedade até que a dívida seja paga -algo que, ainda segundo eles, não ocorreu. Por isso, entraram com uma petição na Justiça para cassar a liminar. A decisão não saiu.
Mesmo que o governo desista de usar as fibras da Eletronet, existe um contrato prevendo que a companhia seja a gestora dessa rede (sem competidores) por mais 11 anos, com punições em caso de rescisão como forma de preservar os sócios privados, a canadense Contem Canada e a Star Overseas, a empresa de Nelson dos Santos que teve José Dirceu como consultor até 2009.

E só. Qualquer repórter iniciante sabe que empresa falida perde a concessão pública. É bê-a-bá de cobertura setorial. Ou a reportagem é desinformada ou abusou da má fé.
Assim, a manchete de ontem – repercutida pelos jornais, rádios e TVs - era falsa e foi reduzida a uma pendência entre o governo (que quer retomar a rede) e os credores (que não receberam pelo equipamento entregue). Onde entram os R$ 200 milhões ao Nelson? Sumiram. Nenhuma linha.
A matéria do Estadão
E por que as negociações da Oi com a Eletronet não avançaram? Vai se saber lendo o Estadão.
Aí entra essa divertidíssima briga entre o aquário e as notícias. O Estadão entra no jogo com chamada de primeira página forçada: «Governo deve assumir dívida da Eletronet, de ex-cliente de Dirceu». A matéria interna do repórter Renato Cruz é correta, descreve a disputa entre o governo e os credores, mostra que ex-acionistas nada receberão.
Na sequencia, uma matéria sobre os interesses da Oi em adquirir a Eletronet. Só que contando com começo, meio e fim e desmontando a nova falsificação de Márcio Aith.
Mostra que a Oi tentou na Justiça uma negociação com os credores que permitiria assumir a Eletronet por R$ 200 milhões. Sendo bem sucedida, Nelson conseguiria receber R$ 50 milhões.

Por que não deu certo? Porque o governo resolveu pegar as linhas para montar a infra-estrutura da banda larga
:
A negociação levou vários meses e estava em estágio avançado. A Oi, Nelson dos Santos e os principais credores da Eletronet já haviam fechado os principais termos do acordo, segundo fontes ligadas à negociação. A Eletronet devia para instituições financeiras como Banco do Brasil e Safra, e fornecedores de equipamentos como a Furukawa e a Alcatel Lucent. A dívida chegava a R$ 800 milhões, mas os credores aceitariam um desconto para receber pelo menos uma parte do dinheiro a que tinham direito.
O acordo esbarrou, porém, no interesse do governo, que diz querer uma rede estatal de internet banda larga. Dona de 49% do capital da Eletronet, a estatal de energia Eletrobrás tinha o direito de vetar o acordo com a Oi. E foi o que fez, quando o governo decidiu retomar a rede de fibras ópticas e recriar a estatal de telefonia Telebrás.

O circuito da repercussão interna
A própria reportagem da Folha não consegue confirmar uma linha da denúncia. Todas as informações durante o dia mostraram que o caso está sendo tratado na Justiça do Rio – portanto, sem nenhuma ingerência do governo federal.
A própria sequencia da reportagem não confirma a denúncia. Esquece completamente, como se não tivesse sido feita, e muda para uma segunda, que não ocorreu.
Confirma-se mais um factóide da Folha.
Internamente, a poucos metros da mesa de Aith, dois colunistas da página 2 e a titular do Painel repercutem a denúncia que já não era.
Fernando Barros da Silva:
Se a Telebrás for reativada, como anuncia o governo, o mesmo bidu que desembolsou R$ 1 pela Eletronet pode sair dela com R$ 200 milhões.
Melchíades Filho:
Não está claro, ainda, se e como a Star Overseas lucrará com essa remontagem do setor, que será anunciada no mês que vem pelo Palácio do Planalto. Mas a remuneração de Dirceu (R$ 620 mil em dois anos) indica que a offshore não esperava pouco. Advogados ouvidos pela Folha estimam em R$ 200 milhões.
“Advogados ouvidos pela Folha”, e só.
Painel da Folha:
Agora chega. José Dirceu, que recebeu ao menos R$ 620 mil de grupo empresarial a ser beneficiado no caso de reativação da Telebrás, tem dito que pretende parar com todas as consultorias e se dedicar exclusivamente à política.
E o grande O Globo? Batata. Manchete principal:
De O Globo
Governo corre para esvaziar denúncia de lobby de Dirceu
Oposição pede CPI para investigar atuação de ex-ministro em nova Telebrás
O governo agiu rápido diante das denúncias de que o ex-ministro José Dirceu teria feito lobby em favor de uma empresa privada que poderia ser beneficiada no Plano Nacional de Banda Larga, uma das prioridades da atual gestão. O empresário Nelson dos Santos, da Star Overseas, sócio da Eletronet, dona de uma rede de fibras ópticas, afirmou que pagou a Dirceu R$ 620 mil entre 2007 e 2009. Essa rede, hoje pertencente a subsidiárias da Eletrobrás, poderia ser usada pela Telebrás, que, reativada, expandiria a banda larga no país.
Com declarações da cúpula do governo sobre a reativação da Telebrás, as ações já subiram 248% este ano. A oposição quer abrir CPI para investigar a denúncia. Páginas 17 a 19

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