quarta-feira, 8 de agosto de 2012

Do New York Times: os ganhos do Brasil em sua relação com a África

Artigo publicado no New York Times.

O Brasil ganha negócios e influência com suas ofertas de ajuda e empréstimos à África

RIO DE JANEIRO - Em Moçambique, o governo brasileiro está abrindo uma fábrica de  medicamentos anti-retrovirais para combater a epidemia de Aids. O Brasil está emprestando $ 150 milhões para o Quénia construir estradas e diminuir o congestionamento na capital, Nairobi. E, em Angola, a potência petrolífera da África Ocidental, um novo acordo na área de segurança visa expandir a formação de pessoal militar angolano no Brasil.

O Brasil, que tem mais pessoas de ascendência Africana que qualquer outro país fora da própria África, está assertivamente elevando o seu perfil no continente, baseado nos laços históricos do tempo do Império Português.


O conjunto de projetos de ajuda e de empréstimos recentemente oferecidos aos países africanos apontam para as ambições do Brasil tanto de projetar uma maior influência no mundo em desenvolvimento e quanto de expandir seus negócios na África, onde algumas economias estão crescendo rapidamente, apesar de partes do continente ainda lidar com guerras e fome. A ofensiva de charme está se pagando nos no aumento nos fluxos de comércio entre o Brasil ea África, que cresceram de US $ 4,3 bilhões, em 2002, para 27,6 bilhões dólares em 2011.

"Há o sentimento crescente de que a África é fronteira do Brasil", disse Jerry Dávila, um historiador da Universidade de Illinois, que escreveu extensivamente sobre avanços do Brasil em todo o Oceano Atlântico Sul. "O Brasil está na posição privilegiada de finalmente alcançar a capacidade institucional para fazer isso".

As incursões do Brasil na África são semelhantes às ambições de outras potências emergentes, como Turquia, que estabeleceu a sua influência no mundo árabe, e promoção, pela Índia, de sua cultura em toda a Ásia.

O destaque dado à África também reflete a mudança do Brasil, de beneficiário de auxílio para provedor. Grandes desafios de desenvolvimento persistem no Brasil, incluindo as lamentáveis ​​escolas públicas e uma forte desaceleração econômica este ano. Mas o Brasil é um grande exportador agrícola, que recentemente ultrapassou a Grã-Bretanha como a sexta maior economia mundial e que, agora, possui mais embaixadas na África do que a Grã-Bretanha - uma notável mudança de quando, na década de 1960, o Brasil dependia da ajuda externa, em grande parte dos Estados Unidos, para aliviar a fome no nordeste pobre do país.

A África agora representa cerca de 55% dos desembolsos pela Agência Brasileira de Cooperação, que supervisiona os projetos de ajuda no exterior, de acordo com Marco Farani, seu diretor. Ao todo, incluindo os intercâmbios educacionais e uma carteira de crédito em expansão, a ajuda externa do Brasil ultrapassa US $ 1 bilhão, disse ele. Grandes porções da ajuda brasileira também vão para países da América Latina, e há um pequeno foco em Timor Leste, antiga colônia Português no Sudeste Asiático.

"Nós ainda temos uma presença menor de ajuda externa do que alguns outros países, mas estamos aprendendo como fazer a cooperação", disse Farani.

O Brasil ainda está atrás de outras nações, nomeadamente a China e os Estados Unidos, que têm programas de ajuda e comércio muito mais expansivos na África. Na América Latina, Venezuela e Cuba têm oferecido diferentes formas de melhorar os laços africanos. A Venezuela organizou uma reunião de cúpula em 2009, entre líderes africanos e sul-americanos, em que o presidente Hugo Chávez estreitou uma aliança com o líder da Líbia, na época, coronel Muammar el-Kadafi.

Durante a guerra fria, tropas cubanas apoiaram governos comunistas na África. Em Angola, esta missão incluiu a tarefa aparentemente paradoxal de proteger um complexo petrolífero da Chevron, ao mesmo tempo que os Estados Unidos apoiavam uma insurgência contra os líderes locais. Mais recentemente, Cuba enviou milhares de médicos para a África.

Mas, enquanto os esforços de Cuba e da Venezuela priorizaram amplamente  a solidariedade do mundo em desenvolvimento com algumas nações africanas, a crescente operação do Brasil na África é mais complexa, envolvendo ambições de fazer do Brasil uma potência diplomática e econômica.

Após uma onda de abertura de missões diplomáticas na última década, o Brasil agora tem 36 embaixadas em África, e espera abrir a sua 37ª no Malawi este ano. O Brasil já está usando esta presença para reforçar suas ações no cenário mundial, enviando jatos para trazer delegações de Serra Leoa, Libéria e Cabo Verde para a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, que foi realizada aqui em junho.
Outros projetos são destinados a atrair africanos para estudar no Brasil. Anos apssado, uma nova universidade começou a oferecer aulas a estudantes de  países de Língua Português, incluindo Angola, Guiné-Bissau, Moçambique e São Tomé e Príncipe.

Como o Brasil não precisa importar grandes quantidades de petróleo ou de alimentos, os seus planos em África diferem um pouco de outros países em busca de maior influência lá. Os projetos se ligam em grande parte com esforços para aumentar as oportunidades para empresas brasileiras, que às vezes trabalham com o governo do Brasil na oferta de ajuda.

Alguns dos maiores avanços do Brasil, previsivelmente, estão em  países de Língua Português, como Angola, onde a empreitera brasileiras Odebrecht está entre os maiores empregadores, e Moçambique, onde a mineradora Vale iniciou um projeto gigante (de U$6 bilhões) de expansão do carvão.

Mas as empresas brasileiras também estão sondando por oportunidades em outras partes da África, fincando estacas na Guiné e Nigéria. Um banco de investimento líder no Brasil, o BTG Pactual, iniciou em maio um fundo de 1 bilhão dólares, focado em investir em África. Novos vínculos também estão surgindo, incluindo empreendimentos agrícolas brasileiros no Sudão; um vôo a partir de Adis Abeba, capital da Etiópia, para São Paulo; e um cabo de fibra óptica ligando o Nordeste do Brasil à África Ocidental.

Algumas incursões do Brasil na África trouxeram complicações, incluindo críticas quanto o estreitamento de laços com líderes ligados a abusos dos direitos humanos, como presidente da Guiné Equatorial, Teodoro Obiang Nguema Mbasogo. Uma medida de liberdade de informação permitiu que jornalistas se aprofundassem em negócios africanos de armas de empresas brasileiras, incluindo a venda de bombas de fragmentação para o Zimbabwe.

Estudantes africanos que estudam no Brasil apresentaram inúmeras denúncias descrevendo insultos e agressões, o que complica o mito de "democracia racial" que já prevaleceu aqui, quando estudiosos afirmavam que o Brasil tinha escapado à discriminação, comum em outras sociedades.

Em um episódio, aqui no Rio, Eleutério Nhantumbo, um oficial de polícia moçambicano, com uma bolsa para estudar segurança pública em uma universidade brasileira, disse que, em uma ocasião, ele foi parado por policiais, que, sob a suspeita de que ele havia roubado algo, mandaram ele para levantar sua camisa ao sair de uma loja. Ele disse que, quando questionou por que o haviam escolhido, os policiais responderam com uma ofensa racial e o advertiram a não falar com eles sem respeito. Ao ouvir seu sotaque Português, eles lhe perguntaram sobre suas origens. "A polícia perguntou: 'Onde pe Moçambique?'", disse Nhantumbo,. "Eles não sabiam que existia um país com esse nome."

O Brasil, durante século intimamente ligado à África por rotas de navegação e pelo comércio de escravos, pensa-se, importou 10 vezes mais escravos que os Estados Unidos, antes da escravidão ser abolida aqui, em 1888. Por um momentono século XIX, o Brasil foi a sede do Império Português, o que tornou sua capital, então o Rio de Janeiro, um centro nervoso do comércio com a África.

Esses laços murcharam até que os líderes civis procuraram estabelecer relações com os governos recém-independentes em África, nos anos 1960. Esse processo esfriou depois que governantes militares tomaram o poder no Brasil, num golpe apoiado pelos Estados Unidos em 1964.

Em seguida, na década de 70, necessidades econômicas e uma busca de construir uma autonomia dos Estados Unidos estabeleceram as bases para o fortalecimento diplomático na África de hoje. Buscando compensar os gastos com importações de petróleo, que incluiam cargas provenientes da Nigéria, os governantes militares buscaram abrir novos mercados na África para as empresas brasileiras. Eles encontraram algum sucesso, nomeadamente na Angola recém-independente.

O ex-presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, trabalhou sobre essas incursões em viagens à África de 2003 a 2010, referindo-se à "dívida histórica" ​​que o Brasil tem com a África em sua formação como nação.

Taylor Barnes contribuiu com reportagem.

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